Ao contrário das habituais histórias que surgem quando o tema são casas, o proprietário desta não andou no mercado desenfreadamente à sua procura. Aliás, esta faz parte da sua vivência pessoal e é muito mais que uma morada de família, “foi aqui que nasci, este andar acompanhou-me a vida toda”, começa por contar André Azevedo, arquiteto e mentor da Build In.
Graças aos seus 190m, o apartamento sempre foi palco privilegiado de reuniões e festas familiares. “Nele passei muito tempo da minha infância e adolescência, era morada dos meus avós e anos mais tarde vim herdar este espaço”, diz o proprietário e autor do projeto.
Em 2005, este prédio de 1965 nas avenidas novas, em Lisboa, passou a ser a ‘nova’ morada de André. Um ano depois, “tinha de fazer qualquer coisa, vendia ou investia. Optei pela última situação e fiz obras profundas”, conta o arquiteto. Apesar de se tratar de uma construção típica dos anos 60, “nem estava mal dividida. Aliás, mantive a estrutura base, só fiz uns pequenos toques para criar uma casa de banho social, perto da cozinha, roubando espaço ao quarto de serviço”, aponta.
Depois da intervenção, à tipologia original foi somada uma divisão, passando de três para quatro casas de banho. Hoje, tem uma sala comum com sala de jantar, hall de entrada e outro de serviço, cozinha, quarto de serviço com casa de banho privativa, zona de estendal, dois quartos apoiados pela mesma casa de banho e, por fim, a suíte principal.
“A nível de conceito foi criada uma regularização do espaço através de alinhamentos de tectos e paredes, para implementar o máximo de continuidade possível. Aliás, a continuidade foi o mote deste projeto”, esclarece o arquiteto.
Em cada espaço muitos são os detalhes em que aquele conceito arquitetónico está presente. Disso é exemplo o nivelamento dos tectos falsos, que escondem infraestruturas e vigas, até às portas de pivot (do chão ao tecto). Estas portas são planos que rodam, estão completamente camufladas quando fechadas, só depois de abertas se percebe do que se trata. Por estarem escondidas, o autor do projeto optou por lacá-las, a branco. Por um lado, com o objetivo de através do brilho marcar estes planos das paredes. Por outro, por ser uma opção funcional de acabamento que permite uma boa manutenção, o lacado é mais resistente a dedadas e riscos. Depois de regular e alinhar, a base ficou mais homogénea, abriu caminho à luz para que pudesse entrar e brilhar por toda a habitação.
Para assinalar separações e dar uma maior dinâmica aos espaços, o arquiteto desenhou ainda dois volumes. O primeiro, junto à cozinha, que além de separar cria ambientes definindo as zonas de circulação. “O que tentei fazer foi concentrar nesses blocos zonas de arrumos extra. A nível formal têm uma grande importância pelo dinamismo conseguido e, ao mesmo tempo, são elementos funcionais”, salienta André Azevedo.
Ainda dentro desta linguagem em que se respeitou a base, o chão foi revestido a carvalho, à moda antiga, com cera de pasta, com uma única exceção, a casa de banho da suíte. A par do brilho dos lacados, foi ainda aplicado muito vidro, a cozinha foi o ponto alto, trata-se de uma verdadeira ‘caixa’ de vidro.
Esta estrutura fechada sobre si própria tem duas entradas que, por serem de vidro, dão uma maior amplitude. O jogo de transparências, materiais e brilhos, permitiu ainda fornecer iluminação natural à zona do hall. “Usei vidro verde e inox polido na bancada, o vidro marca o plano de trabalho através do contraste pela cor, o inox polido, no sentido que este material se anula, funciona como um espelho, reflete tudo, mas também se anula”, explica.
Em simultâneo com os melhoramentos arquitetónicos, André Azevedo foi pensando a decoração e o local exato de cada uma das peças. “A sala foi moldada para acolher estes sofás, fazem parte do projeto. Decoração e arquitetura estão completamente integradas. A grande protagonista não abafa a decoração, permite até que vários tipos e estilos de objetos se associem e criem ambientes distintos. Caso da sala de estar, em tons de vermelho e zona de refeições em tons de dourado”, salienta André.
Tal como no passado, a casa continua a ser uma morada vivida. Na teoria, com as características ideais para se manter na história familiar, mas como arquiteto que é, André lá acaba por confessar, “tenho alguns conflitos com ela porque sempre me acompanhou e por não ter sido escolhida por mim. Mudava apenas alguns detalhes, para já”.
Decoração: Continuidade dinâmica dos anos 60
Partindo de uma base homogénea, conheça a história de uma remodelação arquitetónica exemplar, numa casa lisboeta típica dos anos 60. Projeto da Build In.
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