Num dos nossos passeios de verão fomos visitar uma das regiões de férias, e não só, mais apetecíveis. Por estar integrada na Reserva Natural do Estuário do Sado, a Comporta é um autêntico paraíso natural banhado pelo rio Sado.
Nesta zona encantadora, além do mar nas imediações e de uma paisagem natural genuína, existem ainda extensos campos de cultivo, com tradição na produção de arroz, batata-doce e mais recentemente vinho. E foi aqui que visitámos duas cabanas reconstruídas, um exemplo de respeito pelas melhores diretrizes ambientais, projeto de arquitetura e decoração assinado por Marta Mantero, decoradora e proprietária de diversas lojas.
Estas cabanas, assim designadas na região, têm uma área de 120m e respeitam na íntegra os métodos de construção tradicionais, uma é em colmo, a outra, em madeira. Nasceram literalmente a partir de ruínas e, tal como diz o velho ditado “quem vê caras não vê corações”, apesar de parecerem iguais a tantas outras que proliferam na zona, no interior, estas cabanas têm as mesmas ‘regalias’ de uma casa. São construídas em palafita (habitações tradicionais assentes num conjunto de estacas em madeira) para precaver humidades, mas registam outras valências atuais, como o aquecimento central ou o pavimento em microcimento.
Marta Mantero, com a ajuda de Nuno Carvalho e o aval do proprietário, acompanhou a reconstrução desde o início até porque o cliente quando adquiriu o terreno (1.600m, incluindo as ruínas) já tinha o projeto aprovado, por isso, todo o processo foi aligeirado.
“Quando comecei a idealizar a obra, fui à arquitetura local beber inspiração. Tentei o mais possível manter o tipo de construção da zona, mas acabei por abrir rasgos maiores para as janelas, fiz também um pé-direito mais alto, dei um toque meu, aqui e ali, sem fugir muito das diretrizes tradicionais. Acima de tudo, não quis descaracterizar a região, como infelizmente se vai vendo em alguns casos, em que as cabanas são completamente em vidro, por exemplo. Dei um ar de contemporaneidade, mantendo o tipo de arquitetura tradicional”, explica a profissional.
Um fio condutor que se estende à sala, onde salta à vista que muitos materiais nela utilizados são típicos da região. É o caso de uma das paredes daquele espaço, cujo acabamento é em reboco de barro. “Utilizámos o reboco de barro porque absorve a humidade e tem propriedades ambientais, a ideia inicial não era funcionar como acabamento, só que o cliente gostou muito de o ver a olho nu e assim ficou… Faz um contraste fantástico com as paredes revestidas a madeira e relembra um pouco o adobe, um outro material característico da Comporta. Pelas suas excelentes qualidades, também há reboco de barro nos quartos, mas como têm um outro acabamento, não está à vista como acontece na zona da sala de estar e no sótão”.
As duas cabanas acabam por se complementar. A nível da tipologia, uma delas tem sala comum, com zona de estar e jantar, cozinha e casa de banho. Na área da cozinha e sala de jantar, aproveitou-se o sótão para mais um quarto. Na outra construção, foram feitos dois quartos de dimensões generosas e boas casas de banho, uma opção sugerida pela profissional e que muito agradou ao proprietário.
A filosofia destas duas habitações reside na ideia de que uma casa de férias tão confortável pode ser também usada durante o inverno, daí o facto de ser climatizada, isolada termicamente e ter vidros duplos. “Existe esta série de comodidades fundamentais porque não queria que fosse uma casa só de verão. Esta zona é bonita o ano inteiro, não é só durante a estação quente. A minha ideia foi tornar as cabanas confortáveis o ano todo, não gosto nada de situações sazonais”, acrescenta Marta Mantero.
Ao nível da decoração, ninguém melhor que a decoradora e proprietária de três lojas de decoração (Almogador, em Cascais e Grândola, e Rice na Comporta) para finalizar o que até ali havia sido edificado. “De acordo com a orientação do proprietário, acabei por fazer todo o projeto, da arquitetura à decoração”, esclarece a profissional.
Quase tudo é novo, pensado para aqui e nada foi recuperado, “apesar de gostar muito de reenquadrar peças em novos projetos”, salienta Marta, para acrescentar “estas casas são bonitas pela sua simplicidade, quanto menos se fizer e menos se colocar mais apelativas se tornam. Basta usar os materiais da zona, só esses detalhes falam por si. Mesmo o cimento, um material que se usava nos pavimentos, foi atualizado para microcimento na cor bege, não foge da tradição local e parece que traz a areia da rua para dentro de casa”, explica a decoradora.
Se a decoração está em harmonia com a construção e a própria vivência na casa, é notória também uma grande preocupação ambiental. Entre outros melhoramentos, foi instalado um conjunto de painéis fotovoltaicos para aproveitamento da energia solar e criada uma mini estação de tratamento de águas residuais, Etar, que elimina a tradicional fossa, trata as águas e as reutiliza para a rega do jardim, da horta e do pomar.
“Construir uma casa o mais ecológica possível foi desde logo uma das premissas, o proprietário gostou e respeitou”, conclui, orgulhosa, Marta Mantero. Digno de registo é o facto de se perceber que aqui tradição e modernidade podem partilhar projetos ao mesmo tempo que se mantém praticamente intacta a pureza de uma região.
Decoração: De natureza genuína
No nosso passeio de verão pela Comporta encontrámos um exemplo de respeito e equilíbrio pelo meio natural. Duas cabanas reconstruídas decoradas por Marta Mantero resultam num projeto cem por cento ecológico.