Quando pensava no que queria ser quando
crescesse,
Carlos Medeiros, agora com 48 anos, apenas sabia
que queria viajar, viajar muito. E durante anos conseguiu fazê-lo.
Como
event designer da Cateri, empresa de
catering e produção de eventos, um dia acordava num sítio
e adormecia noutro. Las Vegas, conta, é a sua cidade preferida para
dar asas à imaginação, que é como quem diz, dar asas… à produção.
Agora, 25 anos de experiência profissional depois, continua a
correr de um lado para o outro. O seu dia começa às sete da manhã e
termina lá para as tantas. Entre a Cateri e o Aura, restaurante no
Terreiro do Paço, ainda tem de gerir a sua vida pessoal e
principalmente cumprir o seu papel de pai e… de filho.
Marta, cuja custódia é partilhada com a sua
ex-mulher, tem 15 anos, está no oitavo ano e, quem sabe, um dia
poderá seguir as suas pisadas.
Irene Santos, a sua mãe, é a pessoa a quem dedica
a sua vida. Estas e outras emoções fazem parte desta conversa. O
encontro foi no Aura.
– Aura é um nome que calha bem…
Carlos Medeiros – Não é por acaso. Um espaço como
este, em qualquer ponto do universo, tem de ter algo que não seja
só a gastronomia. É bom sabermos que vamos a determinado local e
que saímos de lá com uma aura diferente. O Aura é quase um spa de
emoções, não é tão sensível ao toque, mas muito sensorial ao nível
do olfato, da visão, do paladar e até da audição, porque temos
música fantástica.
– É aqui que tem passado grande parte do seu
tempo?
– Divido o tempo entre o Aura e a Cateri, porque
tenho de assinar as produções, criar as propostas, os momentos e
estar presente. O
Fabrice [Marescaux], sim, fica aqui o dia todo e
eu venho ao final da tarde para estar com a equipa para dar
formação. O meu dia de trabalho tem geralmente entre 14 a 16 horas,
mas dá-me um prazer enorme…
– No meio de tanto trabalho, como é que arranja espaço
para a sua vida pessoal?
– A minha vida pessoal e a profissional estão
completamente integradas. Por exemplo, ainda hoje, para fazer esta
produção levantei-me às 6h30 e deixei a Marta na escola meia hora
mais cedo. Eu prefiro que ela se levante meia hora mais cedo e
irmos aqueles 20 minutos de carro a conversar do que pedir à
empregada ou a alguém para a levar à escola.
– A Marta está com 15 anos…
– Sim, mas acha que tem 18 anos… [risos]
– Diz-se que é uma fase que merece algum
acompanhamento…
– Eu sempre tive esta vida e certamente estou
muito mais presente que muitos pais. O facto de estarmos em casa às
oito da noite e jantarmos com os nossos filhos não quer dizer que
estejamos com eles. Eu posso não estar em casa à hora de jantar,
mas estou com ela nos vários momentos importantes da vida dela.
Falamos ao telefone várias vezes por dia e as novas tecnologias
também nos permitem estar sempre em contacto. Há muitos pais que
estão em casa mas não têm tempo para os filhos. O afastamento
físico não tem nada a ver com o afastamento emocional.
– Há pais que se culpabilizam por não passar tanto tempo
como gostariam com os filhos…
– Sim, há muitos pais que se penalizam por terem
vidas idênticas à minha, que se culpabilizam por trabalharem
demasiado. A esses pais digo para não se preocuparem, porque o
importante é termos um papel ativo no dia a dia deles,
independentemente das horas que passamos juntos.
– A Marta tem crises típicas da adolescência?
– Ela é uma adolescente fácil. Claro que há
momentos em que se excede, mas quem impõe as regras sou eu. Por
exemplo, a Marta é muito espontânea e ‘parte o mundo’, mas com uma
conversa de dois minutos rapidamente desce à terra e muda a
atitude.
– E já mostra algum gosto por esta área? Acha que vai
seguir as suas pisadas?
– Bem, ela gosta de cozinhar e de estar presente
em alguns eventos nossos. Nas férias de verão esteve no Aura a
trabalhar. É fundamental um jovem da idade dela partilhar
experiências a vários níveis. E é bom para ela conhecer pessoas
diferentes, respeitar hierarquias.
– E abdicou de ânimo leve das idas à praia com
amigos?
– [risos] Ela pedia-me uma folga ao fim de dois
dias. Mas enquanto estava a trabalhar a atitude era adulta e
cumpria os objetivos. Acho que é benéfico ter várias experiências
ao longo da vida.
– Mas gostaria que a Marta desse seguimento aos seus
projetos?
– Ela está no oitavo ano, não faz parte dos meus
sonhos que ela seja o que quer que seja do ponto de vista
profissional, mas sim que seja bem formada e muito bem orientada.
Tento dar-lhe várias perspetivas do mundo, desde o mais sofisticado
ao mais simples. Tento prepará-la para ser capaz de se relacionar
com qualquer pessoa e nesse aspeto acho que é uma vencedora.
– Hoje, os jovens não sabem o que querem ser. Nessa idade
o Carlos já tinha perspetivas?
– Eu queria viajar e sabia que queria uma
profissão que me levasse a qualquer lado do mundo. Andei num
corrupio durante anos. Aconteceu-me acordar a meio de uma viagem e
ter de pensar duas vezes qual era o destino. Foi uma ótima
experiência.
– O que é que espera daqui para a frente?
– Recuso-me a ver notícias. Vejo os canais que me
fazem sonhar e pensar positivo. É importante saber o que está a
acontecer, mas não tenho de criar pensamentos negativos nem de ser
pessimista. Depois, em termos pessoais, quero continuar a ser um
bom ser humano, ajudar quem está ao meu lado. Tenho três sócios
completamente distintos e com respeito e amizade quero continuar
este elo mesmo nos momentos em que não estamos de acordo uns com os
outros. Quero crescer com eles. Isto não passa só por dinheiro,
passa por estabilidade emocional, compreensão. Depois, em relação
às mulheres da minha vida, a minha mãe e a minha filha, são elas
que me fazem lutar e olhar para o futuro. Antes de um de nós
desaparecer quero ter a sensação de missão cumprida. Quero ter a
certeza de que fiz o
best of the best a todos os níveis.
Carlos Medeiros: “Quero continuar a ser um bom ser humano”
O ‘event designer’ conta como gere a profissão e a vida familiar, da qual faz parte a filha, Marta.