Mesmo para quem passa ao longe, é impossível ficar indiferente à força que emana da Quinta de Cidrô. A história que cruza esta propriedade com a família Silva Reis remonta a 1960, quando Manuel Silva Reis, já falecido, decidiu adquirir a Real Companhia Velha. Hoje, a família prossegue o negócio, que espelha uma união transversal às várias gerações, como pudemos observar neste dia de reunião familiar que juntou a matriarca, Rosa Maria, de 84 anos, os três filhos desta e respetivos núcleos familiares: Pedro, a sua mulher, Francisca Dória, e o filho, Pedro; Manuel com a filha, Maria Beatriz; e Raquel com o marido, Gastão Mendes, e os dois filhos, Vasco e Raquel.
Depois das fotos em conjunto, foi a Pedro, irmão do meio, que coube o papel de porta-voz, descrevendo o trajeto desta empresa familiar e identificando os valores pelos quais se regem.
– Este é um projeto que começou muito antes da vossa existência..
Pedro Silva Reis – Exatamente. O meu pai assumiu a Real Companhia Velha em 1960, que celebra este ano o seu 260.º aniversário. Já era proprietário da Quinta das Carvalhas e depois, em 1972, adquiriu esta quinta.
– Com uma empresa com 260 anos, imagino que tenham na vossa posse alguns documentos preciosos…
– O espólio da Companhia contempla, atrever-me-ia a dizer, a história do vinho do Porto, entre 1756 e 1834, quando a companhia funcionou como a Companhia Majestática, o órgão regulador da produção e do comércio de vinho do Porto. É mais que uma empresa, é um pedaço da história do norte de Portugal e muito da intervenção do Marquês de Pombal na produção de vinho do Porto, ao fundar a própria companhia, que começou por ter como primeira missão a demarcação do Douro, a primeira região demarcada do mundo, um conceito inovador.
– Hoje, tanto o Pedro como os seus irmãos trabalham na empresa. Foi sempre essa a vossa vontade?
– Nós já nascemos formatados, o meu pai sempre nos puxou para isto. Nunca nos passou pela cabeça fazer outra coisa. É um negócio que tem um lado emocional muito grande. Passámos uma boa parte da nossa infância por estas quintas, por conseguinte, sempre tivemos uma ligação muito grande à terra e ao Douro.
– E que funções desempenha cada um de vocês na empresa?
– Trabalhamos todos juntos na administração. Eu ocupo-me mais do controlo de gestão, o meu irmão da parte comercial, e a minha irmã das relações-públicas.
– Se todos tinham vontade de seguir este caminho, deverá ser fácil trabalhar em família…
– Embora tenhamos personalidades muito diferentes, somos muito unidos como irmãos, temos uma empresa verdadeiramente familiar. Como todos os irmãos, temos tendências para divergir [risos], mas conseguimos entender-nos, porque os objetivos são sempre para o melhor da empresa. Sermos três torna tudo mais fácil, porque nunca há empates [risos].
– Hoje também já contam com mais um membro da família a trabalhar na empresa…
– É verdade. Da geração vindoura, temos já um no ativo, o meu filho Pedro, mas já está outro na calha, o Vasco, filho da Raquel. O normal é que façam uma experiência profissional fora, depois vão ingressando.
– Apesar de todos os incentivos, os vossos filhos poderiam não querer seguir o negócio da família. Temiam que isso acontecesse?
– Por um lado, é uma grande satisfação que eles se interessem, por outro, uma empresa familiar tem de ser disciplinada. Deve entrar quem se interessa, for capaz e mostrar empenho. Não entram na empresa só por ser da família, isso é um mau critério.
– Atualmente, são proprietários de cinco quintas. Com o panorama nacional atual, é um negócio que se ressente?
– O negócio do vinho sofre como todos os outros. Nesta última crise, talvez tenhamos sofrido menos que outros setores, na medida em que temos uma componente de exportação muito grande. O vinho do Porto foi sempre, desde os primórdios, um vinho de exportação. O vinho do Douro, até há pouco tempo, tinha uma exportação mais pequena, mas tem vindo a crescer e hoje o modelo de negócio é bastante equilibrado. O vinho do Porto tem ajudado a abrir portas ao do Douro, por ser uma marca consagrada, com presença em todo o mundo.
– Falando sobre esta época do ano: porque escolheram, de entre as cinco vinhas que têm, esta para passar o Natal?
– Este nosso Natal, de 2016, no Cidrô, é um pouco uma homenagem ao nosso pai, numa altura em que a Real Companhia Velha celebra 260 anos. Tem um peso muito grande no legado que ele nos deixou, quer por toda a inovação, pela viticultura que aqui se pratica, quer pela reforma da casa e todo o empenho pessoal e carinho que ele tinha por esta propriedade. Achámos que passar aqui este Natal seria uma boa escolha, porque a memória dele aqui está muito presente, talvez mais do que em qualquer outra quinta.
– Com uma família tão numerosa, é complicado reunir todos no Natal, ou fazem questão de manter essa tradição?
– Cada vez é mais difícil, porque os mais novos hoje já cresceram e têm interesses diferentes. A nossa mãe é o polo centralizador, é ela que faz o elo de ligação, que é muito importante para manter o core da família. Felizmente está de muito boa saúde e tem um papel dinâmico a agregar a família. Hoje já não se atreve a cozinhar, mas gosta de ser orientadora, de manter vivas todas as tradições de que gosta, e isso faz com que esteja sempre atenta a tudo o que possa também reavivar a memória do nosso pai.
Família Silva Reis reúne-se numa das suas quintas para celebrar o Natal
Rosa Maria Silva Reis e os três filhos, Pedro, Manuel e Raquel, receberam a CARAS na Quinta de Cidrô, no Douro.