“Os místicos dizem que o meridiano do Rio de Janeiro está situado no chacra do coração”, diz Margarida Rebelo Pinto. Talvez por isso, a cidade maravilhosa ocupe um lugar tão especial na vida da autora. Afinal, foi lá que encontrou o seu lugar quando percebeu que o filho, Lourenço, de 21 anos, já não precisava tanto dela e também foi lá que se encontrou, através da paz interior que a meditação lhe trouxe. “Já que vivemos aprisionados no nosso próprio corpo e espírito, que o espírito não seja tirano, que seja um hóspede da alma, e que estar dentro do nosso corpo seja uma viagem e não uma prisão. Tive uma educação católica, sempre fui uma boa cristã, mas nunca fui uma católica fervorosa, portanto, sempre tive um apelo da espiritualidade que encontrou a sua paz e o seu aconchego interior na meditação”, confessa a escritora, que acaba de lançar o seu 24.º livro, O Meu Amor Existe.
– Quanto deste livro é que é de facto a Margarida?
Margarida Rebelo Pinto – Muito. Desde o Diário da Tua Ausência, que é uma grande carta de amor, que não escrevia um livro que desse tanto de mim. Este recolhe muitos textos, poemas, pensamentos e desabafos que estão espalhados na minha vida ao longo do tempo. Criei uma espécie de diário de uma paixão, que é real na sua essência, mas completamente ficcionada no tempo e nos lugares. Portanto, aqueles lugares que aparecem no livro, que são onde me sinto em casa e onde gosto de escrever, nem sempre correspondem aos textos, tal como as datas. Mas é um livro muito do coração.
– É dona do seu coração?
– Tem dias [risos]. Sou dona do meu coração, mas passei um período grande de solidão quando o Lourenço cresceu e foi à vida dele e esteve um ano fora. Também foi por isso que comecei a vir para o Rio de Janeiro, cidade que se tornou uma segunda vida e hoje estou cá como em casa.
– E deixa que lhe roubem o coração?
– Só de dez em dez anos.
– Porquê?
– Porque os corações são órgãos frágeis e têm que ser protegidos.
– Já viveu o seu grande amor?
– Já, já vivi o meu grande amor. Não sei se virá outro, acho difícil.
– Perante essa constatação, como é que encara o amor que ainda tem por viver?
– Espero sempre o melhor da vida. Mas acho que há um fator aleatório, que tem a ver com o timing, o momento em que as pessoas se encontram. Não escolhemos por quem nos apaixonamos, não escolhemos quando deixamos de estar apaixonados… O amor é muito aleatório e misterioso. Quanto mais escrevo sobre ele, menos sei, mas não estou preocupada. A vida é mesmo assim e é preciso ter sorte e acertar no tempo e no modo. E, de facto, há pessoas a quem sai a lotaria da vida, que conseguem ter tudo em todas as áreas, mas são poucas ou nenhumas. E a vida é assim, não se consegue tudo e isso não é mau. Mas sou muito sonhadora e… Enfim, não faço previsões.
– Como é que se refaz de um amor que se perde?
– Respiro fundo, faço muito desporto, trato-me bem e olho para o futuro. Tento não perder muito tempo a pensar no passado. O problema dos escritores é que vivem o mesmo amor várias vezes: quando o estamos a viver e quando estamos a escrever sobre ele. E aquilo que nos alimenta também nos mata. É uma vivência muito intensa a nível emocional. Não há nenhum pensamento, por mais válido que seja, que consiga apagar um sentimento.
– No livro, escreve que acredita “numa vida a dois em que a rotina não mata o desejo”. É isto que faz uma relação durar?
– Sem dúvida. Além da solidariedade, do espírito de equipa e da divisão das tarefas familiares, se não houver desejo nem chama é a mesma coisa que gerir um infantário com outra pessoa. É uma sociedade. Mas eu sou um caso muito especial, porque sou filha de um casamento muito feliz e os meus pais mostraram-me que felicidade, sexualidade, conjugalidade e fidelidade podem existir todas debaixo do mesmo teto ao mesmo tempo.
– No futuro, a felicidade não passa por uma relação?
– Passa, mas tem que ser uma grande relação. Não vou para segundas escolhas, nem para coisas confortáveis. Não tenho medo nenhum de estar sozinha. Aprendi a ser feliz.
Margarida Rebelo Pinto: “Já vivi o meu grande amor. Não sei se virá outro, acho difícil”
No seu novo livro, “O Meu Amor Existe”, a autora (fotografada pela CARAS no Rio de Janeiro) mostra uma faceta até agora desconhecida: poemas que escreveu ao longo da vida.