Tudo começou com um rato
Inteligente, vivaço, destemido, generoso, astuto, divertido, amigo do seu amigo e namorado amantíssimo, Mickey, o rato mais famoso do mundo, viu a luz há 90 anos, saído da cabeça e do traço inventivos de Walt Disney, um génio hiperativo que atravessou vários períodos difíceis, declarando bancarrota mais do que uma vez, mas que nunca se deixou abater, acabando por criar um mundo de fantasia que se tornou um colosso financeiro e que, como o próprio lembrava, “começou com um rato”.
Trampolim do sucesso do seu criador, Mickey nasceu num rasgo, em 1928, durante uma viagem de comboio, num momento em que os estúdios de animação que Walt Disney criara com o seu irmão mais velho, Roy, atravessavam uma grave crise, pois a Universal Pictures não só patenteara como sua a primeira personagem que tinham concebido como lhes roubara a maioria dos seus desenhadores.
Disney tinha apenas 18 anos quando conseguiu o seu primeiro emprego como desenhador, numa agência de publicidade onde fez amizade com Ub Iwerks, que se tornaria seu estreito colaborador e seria, na verdade, quem aperfeiçoaria os traços de Mickey, dos vários amigos deste que foram nascendo – Minnie, Pateta, Pluto, Pato Donald ou Margarida – e dos vilões seus arqui-inimigos, entre eles Bafo de Onça, Irmãos Metralha e Mancha Negra.
Ainda em 1928, o Disney Brother’s Studio lançou a curta-metragem Steamboat Willie, ainda a preto e branco, mas já com som sincronizado (e com Walt a dar voz a Mickey), que em duas semanas de exibição na Broadway arrecadou mil dólares, o valor mais alto conseguido por um filme de animação até à data. Tinha começado o sucesso imparável de Mickey, vedeta mundial que tem até uma estrela no Passeio da Fama.
Pai dedicado e brincalhão
uarto dos cinco filhos de Elias e Flora Disney, Walt Disney (1901-1966) não teve uma infância fácil, tanto devido ao aperto financeiro com que a família sempre viveu como porque Elias era um cristão com rígidos valores morais e adepto da disciplina à moda antiga, ou seja, praticante das punições corporais. Walt era ainda criança quando o pai o obrigou a contribuir para o orçamento doméstico, levantando-se às 4h30 da madrugada para distribuir um jornal matutino e prolongando o dia até bem tarde, pois após a escola tinha de distribuir também um vespertino, em Kansas City, para onde os Disney se mudaram em 1911, depois de vários anos passados numa quinta no Missouri. Nessa quinta, Walt desenvolveria uma grande paixão por animais, que adorava desenhar, sem imaginar que um dia esse se tornaria o seu modo de vida.
Em 1923, Walt conheceu Lillian Bounds, que tinha entrado como secretária para os Estúdios Disney (passando mais tarde a colorista), e casou-se com ela em julho de 1925. Parceira das aventuras do marido ao longo dos 41 anos de casamento, quando Walt lhe mostrou o desenho de um ratinho e lhe disse que pretendia chamar-lhe Mortimer Mouse, Lillian sugeriu o nome Mickey e ele aprovou-o de imediato.
Marcado pela dureza do trato paterno, enquanto pai Walt Disney seria o oposto para as suas duas filhas – a biológica, Diane Marie, nascida em 1933, e Sharon, que o casal adotou com apenas duas semanas, em 1936. Carinhoso, dedicado e brincalhão, foi também para elas que criou muitas das suas histórias de encantar, sem no entanto se vangloriar disso. Num livro que escreveu sobre o pai, Diane recorda que só aos seis anos soube quem ele era realmente por um colega de escola e que quando à noite confrontou Walt com o que descobrira e lhe perguntou: “És mesmo ‘o’ Walt Disney?”, e ele lho confirmou, lhe pediu: “Podes dar-me um autógrafo?”
“Fábrica” imparável de filmes fantásticos
A animação fascinava tanto Walt Disney que, depois de conseguir equilibrar as finanças dos seus estúdios com o êxito alcançado com Mickey, alargou o reportório a novas personagens. Entre 1929 e 1939, por exemplo, produziu a série de curtas-metragens Silly Symphonies, que funcionou como uma plataforma para a experimentação de novos processos e técnicas de animação, nomeadamente o uso do Technicolor e a aposta em músicas originais para os seus cartoons. Uma das Silly Symphonies, Os Três Porquinhos, ganharia mesmo o Óscar de Melhor Curta-Metragem de Animação em 1933.
Com os lucros conseguidos com esses primeiros filmes, Walt criou uma escola de desenhadores nos seus estúdios, o que lhe permitiu produzir, finalmente, a sua primeira longa-metragem, Branca de Neve, em 1937, que rendeu, à época, um milhão e meio de dólares e ganhou oito Óscares. Seguiram-se sucessos atrás de sucessos, entre eles adaptações de clássicos da literatura infantil como Pinóquio ou Cinderela.
Nunca deixando de manter o foco na fantasia, nos anos 50 a Disney estreou os seus primeiros filmes com atores de carne e osso, entre eles A Ilha do Tesouro, de 1950, e, em 1964, Mary Poppins, em que atores contracenam com figuras de animação, e que ganhou cinco Óscares, ocupando em 2006 a sexta posição no top dos 25 maiores musicais americanos de todos os tempos.
Nomeado para 59 Óscares e vencedor de 22 e de quatro honoríficos, Walt Disney morreu em 1966, de cancro, mas os seus estúdios estavam perfeitamente oleados para continuarem a produzir filmes a um ritmo imparável até aos dias de hoje. Entre os sucessos dos anos mais recentes constam A Pequena Sereia, Toy Story, Nemo, os Incríveis ou a saga Piratas das Caraíbas.
Viagem à terra dos sonhos
Todos os nossos sonhos podem tornar-se realidade se tivermos a coragem de os seguirmos.” Esta foi uma das máximas que Walt Disney aplicou à sua vida e que fez dele um dos maiores self made men de todos os tempos. Porque Disney, além de criativo, visionário e incansável, tinha várias outras capacidades invulgares: um otimismo inabalável e, de facto, uma capacidade de sonhar sem limites, que atribuía ao facto de ter sabido manter sempre viva a criança dentro de si, e que lhe permitia compreender e ir ao encontro dos desejos dos seus pequenos consumidores.
Fundador de uma das maiores máquinas de entretenimento de todos os tempos, Walt nunca se deixou vencer pelas contrariedades e, ultrapassado um obstáculo, já estava a pensar no passo seguinte. E como pensava sempre em grande, assim que os seus estúdios cinematográficos deixaram de precisar da toda a sua atenção investiu num projeto que muitos consideraram megalómano – e era-o de facto –, mas que se revelou um sucesso sem precedentes: a criação de um parque temático onde pais e filhos pudessem divertir-se em simultâneo, coisa de que sentiu falta quando as filhas eram pequenas.
Em 1950 começou a ser planeada e em 1955 foi inaugurada em Anaheim, na Califórnia, a Disneyland, onde desde então famílias inteiras mergulham em atrações irresistíveis alusivas a todo o universo Disney.
Seguiu-se, em 1971, sete anos depois da morte de Walt Disney, o Disney World, perto da cidade de Orlando, na Flórida, que é ainda hoje o resort de entretenimento mais visitado em todo o mundo: recebe anualmente mais de 52 milhões de pessoas.
Posteriormente, a empresa expandiu os seus parques para fora dos EUA, com a abertura do Tóquio Disney Resort, em 1983, e da Disneyland Paris, em 1992. Hoje existem também parques temáticos da Disney em Xangai e Hong Kong.