A palavra que tem o poder de magoar é a mesma que pode fazer renascer. E Sónia Tavares tem a energia que lembra isso mesmo, porque dela emerge a força de quem sempre usou as adversidades para aprender e se elevar e a doçura quase inocente de quem acredita que o amor e o coração sabem sempre o caminho. Um caminho que se tornou mais especial há dez anos, quando a vocalista dos The Gift conheceu o marido, Fernando Ribeiro, num projeto de homenagem a Amália Rodrigues a que deu voz, Amália Hoje. “O Fernando é a melhor pessoa do mundo. Se toda a gente tivesse um quarto de coração como o Fernando tem, o mundo era muito melhor. E depois é muito giro”, diz a cantora nesta conversa com a CARAS, em que falou, como faz sempre, com o coração. Um coração que expande quando o assunto é o filho, Fausto, de sete anos, e o seu amor pela música. “Os The Gift estão num patamar ótimo, fazemos os concertos e as digressões que queremos, continuamos a fazer parte do cartaz dos bons festivais portugueses e dos internacionais também, mas sei que não vou subir daqui. É uma questão de nos tentarmos manter com alguma dignidade, o que iremos conseguir, porque tudo o que fazemos nos vem do coração”, sublinhou.
– É das artistas mais carismáticas do panorama musical português. Sente que a sua imagem e a forma camaleónica como a usa é também uma afirmação de quem é?
Sónia Tavares – Sim. A diferença sempre foi um conforto para mim.
– Em que sentido?
– Desde miúda que percebi — pelo bullying, pela maneira como as pessoas me tratavam — que não era igual às outras. Percebi que ser diferente não era necessariamente mau e comecei a tirar partido desse lado e a fazer dele um conforto.
– Numa sociedade onde tudo parece ter que encaixar, cultivar a diferença é uma arma?
– Com 42 anos é, com 12 não era. Nem com 22. Só com uma certa maturidade é que percebi que posso encontrar beleza no que não é necessariamente bonito para os outros. Hoje não me interessa nada se sou aceite ou não. Mas demora um bocadinho até aqui chegar, até ter esta confiança.
– Que mossas é que essas circunstâncias fizeram no seu interior?
– Agora nenhumas, mas moldaram um bocadinho a minha personalidade, a minha maneira de ser, de reagir e de ver a humanidade.
– Fale-me desse moldar.
– Percebi cedo que a vida não é fácil, pelo menos para os ‘patinhos feios’. Para os que estão bem na vida e para os filhos dos pais influentes, já não é bem assim. E tudo isso molda a personalidade de uma adolescente e pode ser um pau de dois bicos: ou a coisa corre mal ou faz-se um esforço. E foi o que eu fiz.
Sónia Tavares “A diferença sempre foi um conforto para mim”
A cantora dos The Gift e voz do projeto Amália Hoje, que pode regressar este ano, é uma das investigadoras do programa “A Máscara”.