Mais do que uma despedida dos palcos com a peça À Margem do Tempo, Eunice Muñoz quis passar o seu legado à sua neta e também atriz Lídia Muñoz, com a qual dividiu o palco do auditório com o seu nome, em Oeiras, durante três noites.
“Estar em palco com a Lídia a partilhar esta experiência honra-me muito, porque a considero uma atriz de inegável talento, com um respeito profundo pela profissão que abraçou. A passagem de testemunho era algo que queria fazer, porque ninguém melhor do que ela para carregar daqui para a frente o apelido que me acompanhou desde sempre e que, de geração em geração, esteve sempre ligado ao teatro. Acho que a Lídia me honrará sempre da melhor maneira e isso deixa-me muito descansada e feliz”, referiu-nos Eunice. Visivelmente feliz, mas também emocionada com esta despedida e com este projeto, Lídia confessou: “Recebo esta passagem de testemunho com tanta humildade como a generosidade que a minha avó teve para comigo. Espero que a honre da melhor maneira que sei com tudo o que me ensinou.”
Aos 92 anos, a consagrada atriz sentiu que estava na altura de terminar a sua carreira de 80 anos, mas não sem antes se despedir do seu público com este espetáculo muito íntimo, no qual avó e neta contracenam sem um único diálogo e apenas ao som da música do maestro Nuno Feist. “É uma grande honra fazer parte deste capítulo da vida da Eunice Muñoz. Cada música que compus acompanha a ação da peça. É uma hora de música sem diálogo e foi muito difícil de fazer, porque tive de imaginar o que é que a Eunice e a Lídia diriam em palco. Mas, com as indicações do encenador, Sérgio Moura Afonso, conseguimos o resultado final. A própria Eunice disse-me que a música era um terceiro ator, e isso deixa-me muito feliz”, assumiu Nuno.
Apesar de ser diretor do Teatro da Trindade e de também ele estar a preparar a abertura daquele espaço, Diogo Infante fez questão de marcar presença nesta noite. “Acontecesse o que acontecesse, eu não podia faltar por todas as razões. Além de todo o amor e carinho que tenho pela Eunice, como amiga, ela é a maior atriz do século, de todos os tempos. Esta é obviamente uma homenagem muito bonita e estou muito entusiasmado por ela. Acho de uma enorme coragem, aos 92 anos, a Eunice ainda vir para cima de um palco, mas acho que é sobretudo um gesto de profundo amor pela neta, uma passagem de testemunho que traz todo um caráter simbólico a esta peça”, disse-nos o ator e encenador.
Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, também assistiu ao espetáculo e adiantou que se prepara para fazer nova homenagem a Eunice: “Acho que fazia todo o sentido que a última representação fosse aqui, no teatro com o nome dela, e fico muito satisfeito que assim seja. E dentro de meses apresentaremos uma escultura dela com o Ruy de Carvalho, um pouco à semelhança da de Fernando Pessoa no Chiado.”
Para os filhos, netos e bisnetos de Eunice, esta foi uma noite muito emotiva, conforme nos disse António Muñoz, o terceiro dos seis filhos da atriz: “Foi um enorme prazer assistir à estreia de À Margem do Tempo, ver a minha mãe e a minha sobrinha Lídia juntas no palco, com uma interpretação extraordinária. Foi, sobretudo, a concretização de uma grande vontade da minha mãe de fazer esta passagem de testemunho de uma carreira notabilíssima, de uma vida inteira dedicada ao teatro.”
Fotos: Luís Coelho