Adriano Moreira morreu no passado dia 23 de outubro, aos 100 anos. Uma vida dedicada à política, ao ensino, à defesa dos valores humanos. Aliás, um dos exemplos a que recorria com frequência para fazer uma analogia com os valores que defendia era “o eixo da roda”: a roda gira, a vida muda, mas o eixo, os valores universais, os que preservam a dignidade da vida humana, não devem oscilar.
Estadista, intelectual respeitado e notável estudioso de assuntos de política internacional, Adriano Moreira nasceu em Grijó, freguesia de Macedo de Cavaleiros, no seio de uma família modesta, que se mudou para Lisboa em busca de um futuro mais promissor para os filhos. Ainda não tinha dois anos completos quando chegou à capital, mas toda a vida se afirmou como um orgulhoso transmontano. Estudou no Liceu Passos Manuel e formou-se em Direito pela Faculdade de Direito, revelando-se desde cedo um aluno exemplar e, mais tarde, um advogado de prestígio.
O seu notável trabalho de investigação, primeiro como professor da Escola Superior Colonial e, mais tarde, como diretor da mesma escola, que agora se designa Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, contribui para que seja convidado para ocupar o cargo de subsecretário de Estado da Administração Ultramarina, em 1960. No ano seguinte é nomeado ministro do Ultramar por Salazar, para que aplicasse as reformas ultramarinas que defendia. A sua passagem pelo Governo duraria apenas mais um ano, já que a política reformista que preconizava, e que sugeria a conciliação entre etnias e culturas, não se enquadrava na ideologia do Estado Novo.
“Os portugueses, pela minha voz, agradecem 100 anos de serviço a Portugal.” (M. Rebelo de Sousa)
Com o 25 de Abril, Adriano Moreira procurou exílio no Brasil, onde deu aulas até regressar a Portugal. Voltou à vida política em 1980, permanecendo no Parlamento até 1995, tendo assumido a presidência do CDS entre 1986 e 1988 e exercido funções de conselheiro de Estado de Marcelo Rebelo de Sousa entre 2015 e 2019. “Atravessou dois regimes, andou pelo mundo, deixando discípulos, defendendo a nossa língua, a nossa cultura, a nossa pátria comum, sempre com inteligência, com brilho, com tenacidade, com orgulho transmontano, com orgulho português. Os portugueses, pela minha voz, agradecem 100 anos de vida, 100 anos de obra, 100 anos de serviço a Portugal”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa após a morte do político e professor, que, em junho deste ano, tinha agraciado com a Grã-Cruz da Ordem de Camões.
Católico, o ex-líder do CDS casou-se tarde, aos 46 anos, com uma antiga aluna, Isabel de Lima Mayer, com quem teve seis filhos. Após a morte do pai, a filha Isabel Moreira, conhecida deputada do PS, partilhou um longo e emotivo texto de despedida onde se podia ler: “Pai, meu amor, amor da minha vida, há dez anos escrevi-te uma carta a dizer deste amor que sempre fez do dia de hoje o dia que mais temi na vida e dez anos depois está tudo inteiro, está tudo intacto, nunca houve entre nós qualquer lacuna. (…) Até já, meu amor diário, amor da minha vida.”
Fotos: Arquivo CARAS, Miguel Figueiredo Lopes/Presidência da República, Marcos Borga/Visão e D. R.