Aos 45 anos, e com uma carreira construída discreta, mas solidamente, acima de tudo no seu país natal, a Alemanha, mas também na Áustria, França, Inglaterra e EUA, Sandra Hüller saltou de repente para o estrelato internacional com a proeza de protagonizar, no mesmo ano, dois dos filmes realizados em 2023 mais premiados e nomeados para troféus importantes: Anatomia de Uma Queda, da realizadora francesa Justine Triet, que venceu a Palma de Ouro em Cannes, teve quatro nomeações para os Golden Globes, entre elas a de Melhor Atriz para a alemã, e tem cinco nomeações para os Óscares, nomeadamente a de Hüller como Atriz Principal, e A Zona de Interesse, do britânico Jonathan Glazer, que recebeu o Grand Prix em Cannes e está também nomeado para cinco prémios da Academia de Hollywood, depois de ter tido três nomeações para os Golden Globes.
Filha de um casal de professores, Hüller, nascida em Suhl, então na Alemanha de Leste, a 30 de abril de 1978, fez o seu primeiro papel em 1996,numa peça de teatro no último ano da escola secundária, apresentada no festival Berliner Theatertreffen, e nesse ano inscreveu-se na prestigiada escola de artes dramáticas Hochschule für Schauspielkunst Ernst Busch, em Berlim, onde se licenciou em 2000.
Talentosa, discreta e algo inatingível, Sandra tem tido que lidar com o outro lado da fama: expor-se nas várias entrevistas que tem dado a propósito deste seu salto para o estrelato. Mantendo o lado pessoal no domínio privado – pouco mais se sabe além de que atualmente vive em Leipzig, na Saxónia, com a sua única filha, Ruby, de 11 anos – só revela algo de si quando fala das personagens. Em A Zona de Interesse interpreta o papel de uma figura real, Hedwig Höss, a mulher de Rudolf Höss, oficial das SS que foi comandante de Auschwitz, onde o casal manteve uma vida idílica com os cinco filhos numa casa luxuosa, separada do campo de concentração apenas por um muro. Um papel que diz ter sido dos mais desafiadores que já fez, por não gostar da insensível Hedwig Höss. “Normalmente, tenho tendência para ser mais empática com as personagens – amo-as mais, dou-lhes mais de mim –, mas com Hedwig sentia que era errado dar-lhe mais de mim. Então, observava-a apenas de fora e fazia o que o Jonathan me dizia para fazer”, disse ao site de entretenimento The Wrap, ao qual reconheceu, ainda assim, que as pessoas do seu país “têm a responsabilidade de não deixar [o Holocausto] cair no esquecimento e não deixar que aconteça de novo”.
Na mesma entrevista falou também da sua experiência no filme ficcional de Justine Triet, em que dá vida a Sandra Voyter, escritora alemã que vive nos Alpes franceses com o marido e o filho, de 11 anos, e que, após a morte suspeita do marido, tem de provar a sua inocência em tribunal. Apesar de dizer que a película de Triet foi libertadora, por lhe permitir o regresso ao seu estilo de trabalho depois de A Zona de Interesse, reconhece que a dúvida sobre a culpabilidade de Sandra lhe tornou um pouco difícil a construção da personagem. “Mas consegui defendê-la, seja ela culpada ou não”, frisa. As dificuldades que ambos os papéis lhe levantaram terão sido aquilo que lhe permitiu conseguir o reconhecimento internacional.