A ascensão e queda de Meghan no Reino Unido foi meteórica, e se é verdade que chegou, viu e venceu, também o é o facto de ter saído de forma muito pouco vitoriosa. E os mesmos que rejubilaram quando, a 8 de novembro de 2016, Harry assumiu, num comunicado, que a então atriz da série Suits era sua namorada, três anos depois reagiram com a maior indignação ao comunicado que anunciou o “Megxit”, no passado dia 8 de janeiro. E não foi só a decisão dos duques de Sussex de abandonarem algumas das suas funções reais e de quererem dividir o seu tempo entre a América do Norte e o Reino Unido que contribuiu para o desamor de que Meghan é hoje alvo. Pelo meio ficaram algumas controvérsias que foram desgastando a sua imagem, muitas das quais parecem bastante injustas.
À exceção dos setores mais conservadores da sociedade britânica, nomeadamente a nobreza mais apegada aos pergaminhos, para os quais a entrada de uma americana, atriz, divorciada e afrodescendente na família real terá sido um choque – e, para desgosto de Harry, consta que o príncipe William se inclui nesse grupo –, o povo inglês em geral recebeu Meghan com verdadeira simpatia e entusiasmo, não tanto porque tivessem uma opinião formada sobre ela, mas por ficarem felizes ao ver Harry feliz.
Há que lembrar que os britânicos têm desde há muito um carinho especial por Harry, por um lado porque desenvolveram em relação a ele um instinto protetor quando ficou órfão com apenas 13 anos, e por outro porque desde cedo perceberam que este príncipe era “uma carta fora do baralho” na família real. E não só por ser o mais rebelde e menos respeitador das convenções – que na verdade até é –, mas porque, mesmo tendo alguns vícios de menino privilegiado, Harry é o único dos Windsor que é realmente genuíno a lidar com as pessoas, que as trata de igual para igual, e que põe as mãos na massa e as suja. Foi o caso durante as duas missões que cumpriu no Afeganistão, onde “comeu pó” e viveu nas mesmas condições que os seus camaradas de armas, onde matou e quase foi morto, ou no ano sabático que passou em África, quando tinha 20 anos, em que se envolveu de alma, mas também de corpo, na ajuda às populações com as quais contactou.
Ora, um príncipe assim, acharam os ingleses, só podia escolher uma mulher com idênticas características. E não se terão enganado completamente. Tendo crescido numa realidade bem distante da que se vive nos palácios da avó do seu marido, Meghan era, até conhecer Harry, uma mulher absolutamente comum, que trabalhou no duro para se sustentar, que construiu uma carreira a pulso, começando, em 2006, pelo patamar mais baixo – assistente de um concurso televisivo –, até chegar à série de sucesso Suits, em 2011. Suits, onde permaneceu até 2018, pouco antes de se casar com Harry, valeu-lhe o sucesso, a abertura das portas de Hollywood, onde fez vários filmes, e uma soma muito considerável de dinheiro, que a tornou completamente independente a nível financeiro.
O facto de ter dinheiro não lhe diminuiu, porém, a sensibilidade. Mostrando que olha com atenção para o mundo que a rodeia e para os problemas dos outros, Meghan soube pôr o seu estatuto de atriz ao serviço dos que mais precisam de ajuda, e muito antes de conhecer Harry já se envolvia com empenho em várias causas, entre elas a defesa da igualdade de género e de raças, a luta contra a pobreza e pelo direito à educação. Causas a que continuou a dedicar-se depois de casada e que certamente não abandonará no futuro.
Sendo uma mulher inteligente, de espírito livre e personalidade vincada, e porque nunca foi submetida a constrangimentos sociais como os que o príncipe sofreu, teve, sem dúvida, uma imensa dificuldade em submeter-se a todas as regras que a esperavam depois de casada, nomeadamente ver pessoas que não conhecia e, como tal, em quem ainda não tinha a mínima confiança a gerir não só a sua agenda oficial, mas também a sua vida pessoal e até a dar-lhe instruções sobre como se vestir. E como não estava disposta a sujeitar-se a isso, depressa começou a desenvencilhar-se dos assessores que lhe tinham imposto, criando fama de caprichosa.
A imagem de Meghan terá ficado ainda mais prejudicada pela intervenção de uma adversária de peso: Kate. Segundo fontes próximas, por não lidar bem com a popularidade da cunhada, que lhe fez muita sombra, a duquesa de Cambridge alimentou intrigas palacianas e sucederam-se os rumores de que a duquesa de Sussex tratava mal o pessoal doméstico, que tinha mau feitio, que era uma oportunista que só queria o estatuto e o dinheiro que o casamento com o príncipe lhe deu e que a sua simpatia nos eventos em que participava era pura representação.
Alimentando todos esses mexericos, a imprensa transformou Meghan na ‘bruxa má’ de uma história que tinha começado como um conto de fadas. Demasiado independente para se sujeitar a ser maltratada gratuitamente e a viver agrilhoada pelas limitações que ser membro da família real britânica implicam, Meghan atingiu rapidamente o ponto de saturação e disse “chega”. E Harry não só a compreendeu como quis o mesmo. Finalmente, também ele pode agora ser o espírito livre que sempre quis ser.