O que a motivou a mudar da publicidade para o design de interiores? Lígia Casanova: 30 anos de design
Queria muito ser mãe e a publicidade é uma vida que exige muitas horas extras, o que é incompatível com a maternidade. Por isso, decidi que trabalharia como freelancer e teria um horário de trabalho que me permitisse dedicar-me aos meus filhos. E assim foi, só quando o meu terceiro filho foi para o colégio é que saí de casa e abri um atelier. Lígia Casanova: 30 anos de design
Como foi o primeiro projeto? Lígia Casanova: 30 anos de design
Foi com um grande amigo, também publicitário, que, quando estava para casar, me disse que gostaria que fizesse o projeto da casa dele porque adorava a minha casa. Disse que era uma loucura e ele disse que não, que só tinha que confiar e assim fiz. Depois foi literalmente uma bola de neve: a cunhada e a sogra adoraram e também quiseram, mais uma grande amiga de família e até hoje tem sido assim, os meus clientes recomendam-me a amigos, as revistas onde saímos, as redes sociais também, apesar de não investirmos muito nesse tema… Lígia Casanova: 30 anos de design
Quais foram as maiores lições que trouxe da experiência em publicidade e como as aplicou nos interiores? Lígia Casanova: 30 anos de design
A publicidade dá-nos maturidade e capacidade para lidar com stress, o que ajuda bastante. Houve ainda uma altura em que fiz direção de arte para cinema publicitário, talvez das coisas que mais gostei de fazer até hoje. Aí pude conciliar o design de interiores com a publicidade e amei a experiência que tive durante quase dois anos, mas conciliar com o design de interiores não é fácil e tive que optar.
Como descreveria o seu estilo e como evoluiu ao longo dos anos?
O meu estilo começou por ter bastante cor, estávamos nos anos 90 e era uma tendência. Com o nascimento dos meus filhos, estava rodeada de cores alegres. Depois comecei a trabalhar a ausência de cor e, aos poucos, comecei a fazer projetos mais minimalistas com um toque escandinavo, por vezes com influências industriais e também wabi-sabi. Em tudo na vida existe evolução e hoje, por exemplo, utilizei preto, que era uma cor impensável no início da minha vida profissional. Um exemplo disso foi ter pintado uma parede com 10 metros em casa.
O lema do ateliê é “to make room for happiness”. Como se reflete nos projetos?
São os próprios clientes, nas casas que habitam ou nos espaços de turismo, quando deixam críticas, que transmitem esse sentimento, que se sentem tranquilos e que sentem harmonia nos espaços. Para mim, isso é mais importante do que me dizerem que está muito bonito.
Projetos mais importantes?
Destaco a Casa Azul, o projeto mais conhecido do atelier, o Monte do Olival e o TheVagar, ambos turismos rurais.
Ao olhar para trás, sobre os 30 anos de carreira, quais os momentos que mais a orgulham?
Talvez o mais importante tenha sido quando consegui as ajudas necessárias para fazermos o projeto da cirurgia pediátrica do Hospital de Santa Maria. Depois, quando estava à espera de uma reunião, sentada na sala de espera, ouvi uns pais cujo filho tinha acabado de entrar para a sala de operações dizerem que hoje se sentiam mais calmos e confiantes naquela sala. Nesse dia, as lágrimas caíram-me com emoção. Outro momento importante foi ter ganho o prémio mais importante da minha vida com um projeto que fiz para a Hermès, com um orçamento muito pequeno, em Hong Kong, quando estava a concorrer com penthouses de milhões de dólares.
Como foi a experiência na hotelaria?
Foi muito natural. Os meus clientes alentejanos, por quem tenho um imenso carinho e que sempre confiaram no meu trabalho, pediram-me para fazer algo que gostasse muito. O primeiro foi a Casa Azul, feita em menos de duas horas. Depois veio a Casa Branca, seguida do Monte do Olival, e eles têm sempre críticas muito boas.
Há algum projeto que considere um marco na sua carreira?
A Casa Decor 2007, quando comecei a ser mais minimalista e talvez tenha sido a viragem e a evolução até aos dias de hoje.
Que significado têm os prémios internacionais conquistados?
Fico muito feliz pelo reconhecimento internacional. O facto de, por 13 vezes, ter sido escolhida pelo Andrew Martin, considerado pela revista Time os Óscares do design de interiores a nível mundial, é motivo de orgulho, assim como os Ring Award e os Arch Design Award também.
De que forma esse reconhecimento influencia o trabalho e a abordagem a novos projetos?
Influencia porque mais clientes estrangeiros nos procuram e mais revistas estrangeiras contactam-nos para publicarem os nossos projetos.
Quais são os maiores desafios que enfrentou nestes 30 anos?
Quando surgiu a crise de 2011, tinha um atelier de 250m² e tive que me adaptar voltando para casa, com 40m².
Como vê a evolução do design de interiores em Portugal e no mundo para os próximos anos?
Vejo que desde a pandemia a casa ganhou uma dimensão muito maior. As pessoas começaram a perceber que a casa é tão importante nas nossas vidas e que apetece cada vez mais que seja o sítio onde se sentem seguras com o mundo todo às voltas. Depois, também há clientes que agora trabalham 50% do tempo a partir de casa, o que faz com que tenham tido de se adaptar à nova realidade. Acredito que cada vez mais o design de interiores é muito importante. É fácil saber do que se gosta, mas não como conjugar e perceber como ajustar as necessidades de uma família ao espaço em que vivem.
Quais são as tendências atuais que mais gosta no design de interiores?
Acompanho as tendências apenas para estar informada, mas não as utilizo muito, apenas para saber as cores e texturas. A minha preocupação é fazer a casa dos clientes para eles e não baseada em tendências, talvez por isso os nossos projetos com vários anos pareçam tão atuais.
Quais são os planos para o futuro?
Gostava de fazer um resort à beira-mar e poder continuar com clientes que gostam de apostar em fazer projetos diferentes.
Existe algum projeto que gostaria de assinar?
Gostaria de fazer um hotel de neve e outro na selva e transformar um celeiro nos EUA e no Canadá numa casa.
Que conselhos dá a quem está a começar?
Que sejam empreendedores e acreditem sempre que é possível, até mesmo para uma designer que se formou em design gráfico e hoje é designer de interiores.
A terminar, como é fazer 30 anos de carreira na área do design de interiores, em Portugal?
Às vezes penso que passaram tão depressa! Adoraria ter mais 30 anos para poder continuar a fazer projetos, mas vai chegar o dia em que me vou dedicar aos meus netos e às minhas viagens.