Tudo lhe correu de feição sem que tenha feito grandes planos. Aliás, Mafalda Pinto Leite não é mulher para espartilhar a sua existência. Por isso, o único plano que faz diariamente é para ser feliz. Começou por querer fazer um curso de cozinha vegetariana e acabou por estudar numa das melhores escolas de cozinha dos Estados Unidos, fez o estágio num restaurante de renome e, num piscar de olhos, estava num cenário de sonho: Maui, no Havai. Depois, passou ainda por Londres, regressando a Portugal já com uma filha nos braços. Por cá, começou uma nova relação, com Francisco Camacho, filho do ex-jornalista da SIC Paulo Camacho. Escreveu o livro Cozinha para Quem não Tem Tempo, trabalha na revista Blue Cooking e tem uma rubrica de culinária no programa Mundo das Mulheres, da SIC Mulher. No próximo ano talvez tenha novidades no que respeita a um espaço seu, mas até lá pretende acompanhar o percurso dos filhos, Marina, de cinco anos, e Vasco, de um. Diz, bem-humorada, que tem um estilo "hippy-chic e muito zen". Para além da cozinha, o seu único vício é a água de coco. – Aos 30 anos, tem um currículo invejável e muitas viagens feitas…Mafalda Pinto Leite – Aos 18 anos fugi… [risos] Acabei por ir para a Escócia, porque queria tirar um curso de cozinha vegetariana. Aos 16 anos tornei-me vegetariana e, como sempre achei pouco interessante o que se cozinhava por cá, comecei eu a fazer receitas vegetarianas em casa. Cozinhava para os meus amigos e reparei que a comida era muito mais saborosa. A ideia foi, então, ir fazer um curso de cozinha ao estrangeiro e voltar para o Porto, para abrir um restaurante. O meu pai não achou boa ideia e foi com dinheiro que a minha avó me deu que fui para a Escócia, para uma comunidade vegetariana auto-suficiente. Fui trabalhar para a cozinha, sem saber sequer o que era isso, e acabei por ficar três meses. Voltei para Portugal, e nessa altura o meu pai percebeu que aquilo era mesmo o que eu queria e deixou-me inscrever num curso no estrangeiro. Consegui entrar na Natural Gourmet Cookery School, em Nova Iorque, e ao fim de um ano tive uma excelente nota. Esforcei-me muito, porque queria provar ao meu pai que estava mesmo empenhada. Fui estagiar para o Chez Panisse, na Califórnia, que era considerado o segundo melhor restaurante dos Estados Unidos. – E depois do estágio?- Fui para o Havai, porque estava lá uma amiga minha como chef num spa de luxo. Saí da Califórnia e fui para lá, onde acabei por ser chef da cozinha. Adorei! Prolonguei o meu visto de estudante e acabei por tirar um curso de educadora infantil. Voltei para Portugal, mas depois fui para Londres, para continuar a vertente internacional do curso de educadora infantil. Ao fim de uma semana, percebi que não conseguia ficar longe de uma cozinha. Fui ao restaurante do Jamie Oliver, adorei e mandei o currículo. Não pensei que conseguisse entrar, mas aceitaram-me logo. Entretanto, fiquei grávida da minha filha… – Conheceu o pai da sua filha lá?- Não, não. Já nos conhecía-mos desde os 15 anos, tínhamos estudado juntos, e ele estava lá a estudar Arquitectura. Voltámos a encontrar-nos, acabámos por ficar juntos e a ter uma filha. Tive de sair da cozinha, porque em Inglaterra e nos Estados Unidos não nos deixam trabalhar a partir de um certo tempo de gestação. Consegui então ir trabalhar para uma livraria em Notting Hill, a Books for Cooks, que eu já adorava e que toda a gente conhece. Tem uma cozinha onde se podem confeccionar as receitas dos livros, e foi ali que fiquei até ter a minha filha."Aos 18 anos fugi… Acabei por ir para a Escócia, porque queria tirar um curso de cozinha vegetariana." – Quando é que voltou para Portugal?- Voltei quando a Marina já tinha dois anos, porque era muito complicado estar a trabalhar e a cuidar dela. Não tinha quem me ajudasse e era complicado andar de um lado para o outro com ela. – Iniciou então uma nova fase. Foi mais fácil ou mais difícil do que lá fora?- Foi uma fase um bocado assustadora. Foi muito mais difícil, porque voltei para o Porto e, depois de ter estado nos sítios onde tinha estado, já não me sentia bem ali. Adoro a cidade, mas já não me dizia nada. Comecei então a pensar em fazer pastelaria, que era o que fazia no restaurante do Jamie Oliver, e inscrevi-me na Universidade Católica num curso de restauro, para aplicar o que aprendia em bolos de casamento. Mas acabei por sucumbir a Nova Iorque mais uma vez… Deixei a minha filha com a avó e fui fazer um estágio para um restaurante que adorava, o Pure Food & Wine, que é considerado um dos melhores dos Estados Unidos. Aproveitei para aprender o máximo. Voltei porque já namorava com o Francisco e também porque já tinha enviado um e-mail para uma revista que apareceu na altura, a Blue Cooking. Aceitaram-me e, quando voltei, fiz a transição do Porto para o Estoril. – E abdicou do que mais gostava, o trabalho entre os tachos e as panelas?- Uma das coisas de que sempre gostei, e para a qual acho que tenho jeito, é para inventar e reinterpretar receitas. Isto permite-me trabalhar em casa e estar com os meus filhos, pois só vou ao estúdio dois ou três dias por mês para preparar as receitas e fotografá-las. – Diz que testou todas as receitas de Cozinha para Quem não Tem Tempo com os seus filhos…- Foram testadas por mim, algumas pelos meus filhos, algumas correram mal, mas depois foram corrigidas. Acho que este livro é muito o que eu sou. Não fiz um esforço para que fosse de cozinha saudável ou rápida, foi mesmo porque gosto de comida simples e rápida. Só no Natal é que passo mais tempo na cozinha. Hoje em dia gosto de poder passear com os meus filhos, de fazer panquecas com a minha filha, e ela não tem capacidade para ficar horas na cozinha. Gosto dessa parte da cozinha, mas em alturas especiais. Por outro lado, acho que todos os dias podem ser especiais com receitas fáceis. – A cozinha é a assoalhada de que mais gosta?- A cozinha é onde a magia acontece. É onde estou com os meus filhos, onde se trocam as receitas e segredos das famílias, e onde se fazem as fofocas todas. Quando tenho jantares ou estou com a minha irmã, estamos sempre todos na cozinha, que é o coração da minha casa. – Conquistou o seu marido com os cozinhados?- Por acaso ele não só não cozinha nada como não gosta mesmo de o fazer. Não tem problema em montar ummóvel, mas de cozinha não gosta nada. No início, cozinhava imenso para ele, hoje em dia, nem tanto. Cozinho mais para os meus filhos. – Como é que são passados os momentos em família?- O Francisco trabalha imenso, eu é que estou mais em casa. No dia-a-dia é complicado estarmos juntos, porque ele chega muito tarde e temos que dar de jantar aos miúdos e pô-los na cama, mas ao fim-de-semana tentamos sempre dar um passeio no paredão e ir à praia, porque o Francisco faz surfe e nós acompanhamo-lo. Não sou nada de sair à noite e privilegio imenso as saídas a quatro. De resto, estou muito em casa e gosto de acompanhar os meus filhos. Por enquanto posso fazer isso.