
Henrique e Vera Balsemão, no Monte Velho Nature Resort, na Carrapateira
João Lima
Sempre que possível, Henrique, de 41 anos, e Vera, de 29, fogem do rebuliço da cidade e, por isso, também não gostam de expor a sua vida pessoal. Desta vez, no entanto, o casal abriu uma excepção e contou como tem sido viver no Monte Velho Nature Resort, um empreendimento de turismo rural, na Carrapateira, e também como o nascimento das duas filhas, Concha, de seis anos, e Maria, de quatro, lhes trouxe uma maior serenidade.
– A maioria das pessoas pode pensar que por morarem no campo têm uma vida mais descansada. Mas não é bem assim…
Henrique – Não é mesmo nada assim! [risos] Em primeiro lugar, temos o problema da distância, pois não há nada aqui perto e perdemos muito tempo a andar de carro. Depois, também, temos alguns problemas em termos de recursos humanos, pois não conseguimos arranjar muitas pessoas com aptidões para trabalhar aqui, e isso faz com que acabemos por ser nós a fazer a maioria das coisas.
– Apesar de serem os proprietários, fazem realmente tudo como qualquer outro empregado…
Vera – Felizmente tivemos a sorte de vir ao mundo com algumas qualidades e com alguma humildade e boa disposição! [risos] Claro que sentimos o dever do que temos de fazer, mas acaba realmente por ser um prazer, visto que no fundo esta é a nossa casa e, por isso, é natural que gostemos de receber bem as pessoas e que tudo façamos para que assim aconteça.
– Em todo o monte há referências a locais que visitam…
Henrique – Sempre que viajamos tentamos trazer alguma coisa connosco que nos faça lembrar essa viagem e que também traga algum do espírito desse país para o monte. Temos coisas da Índia, da Guatemala…
– Quando vão de férias, conseguem abstrair-se do trabalho, de tudo o que implica não estarem no monte?
Vera – Se tirarmos férias nas alturas certas, tudo funciona. Acabamos por tirar férias em Janeiro, na altura em que aqui é mais calmo.
Henrique – Claro que estamos sempre a par de tudo o que se passa. A verdade é que a nossa intenção é arranjar propostas para os clientes, para que nunca haja época baixa. Pretendemos que as pessoas que cá vêm voltem às suas raízes e reflictam.
– O Henrique já tinha a Carrapateira como um local de eleição, mas a Vera era totalmente citadina quando criaram este empreendimento de turismo rural, em 2001. Foi uma adaptação difícil?
Vera – Não. Tive as minhas filhas logo a seguir e tudo fluiu naturalmente. Consegui parar e mudar a minha vida, e é isso que também tento transmitir às pessoas que cá vêm. Tudo depende da filosofia de vida de cada um, das suas prioridades e do que é essencial ou não, mas esta é a nossa harmonia. Sinto-me lindamente aqui.
– A Vera da cidade é diferente da Vera do campo?
– Não sei… Ainda me estou a conhecer. Temos uma vida inteira para nos conhecermos e todos nós temos épocas e transformações. Sou eu própria, sempre verdadeira, embora em situações diferentes.
– E também já arranjou um ‘escape’, visto que criou uma loja no monte, a Sunset Shop, e ainda se dedica à pintura…
– Faço realmente questão de fazer um pouco de tudo. No ano passado montei uma tenda marroquina, onde fiz uma loja, com coisas à consignação, de várias marcas, e, como correu bem, criei a Sunset Shop. A pintura é um gosto pessoal que me permite ter tempo para estar comigo. Não tem nada que ver com inspiração. Sou eu própria, aquilo que sinto cá dentro. Todas as minhas pinturas são um processo, e o maior desafio é o durante e não o resultado final. O que pinto não tem nada que ver com lógica ou estética, acaba por ser qualquer coisa que vai saindo e que me vai ajudando a resolver enquanto pessoa. É uma terapia.
– Sentem-se privilegiados por poderem dar esta qualidade de vida às vossas filhas?
Henrique – Sem dúvida! E cada vez mais tenho a certeza que para elas é óptimo morarmos aqui, pois caso contrário não teriam noção das coisas do campo e da vida animal. Elas adoram e fazem questão de nos ajudar em tudo. Claro que mais tarde poderão optar por ir para a cidade, mas felizmente conseguimos dar-lhes uns primeiros anos como estes, no monte, que julgo valorizarão para sempre as suas vidas.
– A formação delas seria diferente se morassem na cidade?
Vera – Claro que sim. Os filhos são o espelho dos pais, mas julgo que, interiormente, elas serão mulheres com menos receios, mais confiantes e abertas para a vida.
– Sente que a maternidade a tornou uma mulher diferente?
– Eu era uma criança! [risos] Aos 21 anos achamos que somos muito adultos e só com o passar dos anos é que nos apercebemos que não éramos! Mas é claro que me mudou, fez-me parar e conhecer-me melhor.
– Tornou-a mais segura?
– Claro que sim. As crianças ajudam-nos a atravessar alguns receios e dúvidas. Tudo isso faz parte do crescimento e, como tive as minhas filhas na mesma altura em que estava a atravessar essa mudança, crescemos em conjunto. Acho que agora teria mais maturidade para ser mãe.
– E tem essa vontade?
– Não sei. Nós não planeamos nada na vida, não pensamos de mais e deixamos que tudo aconteça, como elas acontecerem também. Não foram programadas e nada na minha vida será nunca programado. Por isso, não faço ideia! [risos]
– E conseguem ter tempo um para o outro?
Henrique – Às vezes é difícil, principalmente porque não temos com quem deixar as miúdas e, sempre que vamos a algum lado, elas têm de ir connosco. Depois, quando elas estão de férias, nós temos mais trabalho, e quando elas estão em tempo de escola, nós estamos mais disponíveis. Esses são os senãos da hotelaria que nos pesam mais. Claro que elas estão sempre connosco, mas nem sempre lhes conseguimos dedicar o tempo e a atenção que gostaríamos. Por outro lado, também estamos mais com elas no dia-a-dia do que a maioria dos pais que tem horários para cumprir. Por tudo isto, é difícil estarmos a dois.
– E trabalham facilmente juntos? É que por vezes a intimidade pode prejudicar as relações profissionais…
– Conseguimos cada um à sua maneira. Seguimos o nosso caminho e vamos fazendo.
Vera – Passamos 24 horas por dia juntos, há oito anos, e se tem resultado até aqui… [risos]
– E o facto de estarem tanto tempo juntos fortalece a vossa relação, ou sentem que pode de alguma forma desgastá-la?
– Tudo na vida segue um equilíbrio. Há alturas que é mais complicado e outras que estamos em maior sintonia. Ninguém está cem por cento feliz ou satisfeito, mas acho que a nossa média é bastante boa. [risos]