O maior sucesso editorial
de sempre no Brasil – tirando, claro está, a Bíblia – é o livro de um padre
católico. Mas não de um padre comum: o padre Marcelo Rossi é uma
referência para os brasileiros e o sucesso deste seu último título, Ágape,
com quase 8 milhões de exemplares vendidos até ao momento, comprova-o. A obra,
que já chegou a Portugal e constitui um bálsamo nestes tempos de angústia e
turbulência, fala de amor, tolerância e perdão, e propõe interpretações do
Evangelho de São João. Ex-professor de Educação Física, formado também em
Teologia e Filosofia, cantor, apresentador de televisão e personalidade
distinguida pelo Papa Bento XVI, o padre Marcelo Rossi consegue
regularmente grandes proezas: em 2008, por exemplo, reuniu 3 milhões de fiéis
no Autódromo de Interlagos, no Brasil. Muito alto, tímido e sereno, e com uma
atitude de grande humildade, Marcelo Rossi – cujo apelido materno é Mendonça,
um nome bem português – esteve entre nós e recebeu Rita Ferro para uma conversa
informal, depois de ter oferecido a cada senhora da equipa da CARAS uma
pulseira de pérolas com duas medalhas da Virgem Maria. “Com que idade foi
chamado, senhor padre?”, perguntou-lhe a nossa entrevistadora. “Aos oito
meses, ainda na barriga da minha mãe, num dia de temporal. Como ela tinha o
pavor de temporais, consagrou-me naquele mesmo dia a Nossa Senhora.”
– Como vê Deus, padre Marcelo?
– Antes de tudo, há que ter uma atitude de abertura aos sinais da verdade
presentes no mundo e na História. Neles, o próprio Deus oferece uma maravilhosa
documentação, que se chama Revelação, na qual o reconhecemos como o Pai
de Jesus Cristo, presença do amor e da misericórdia divina entre nós.
– Acredita em milagres?
– A crença em Deus significa crer em sua ação na história, mesmo fora do curso
habitual das coisas. Os milagres expressam a Providência divina e marcam, com
sinais sobrenaturais, a vida humana.
– Como explicar a quem não tem fé, e mesmo aos que a têm, que umas vezes
Deus interfere e outras não?
– “Deus não quer o mal como tal”. Porém, em vista da dignidade humana, “Deus
permite o mal”, pois é desejo seu que, no mundo criado, haja liberdade.
– A fé é um privilégio? Se afirmativo, a aparente injustiça começa logo
aí…
– Dom concedido por Deus a todo o ser humano, a fé lhe permite aceitar e
reconhecer a verdade comunicada por Ele. Pois “fé é garantia do que se
espera e a prova das coisas que não se vêem” (Hb 11,1).
– Associamos a sua imagem à alegria. A alegria depende da felicidade?
– A alegria é um sentimento, mas, sobretudo, uma atitude interior. S. Francisco
de Assis a compreende como paz ou serenidade, diríamos felicidade, que o
leva a cantar a natureza, chamando as criaturas de irmãos e irmãs.
– O padre Marcelo é uma pessoa amada, lida e aclamada por milhões – como se
protege da vaidade e da soberba?
– A meditação sobre a vida, com seus limites e abertura à sublimidade divina,
leva-me constantemente ao encontro da minha pequenez. Com Santo Agostinho,
exclamo: “Eu, pequena porção de vossa criatura.”
– Da última vez que estive no Brasil, achei pornográfica a quantidade de
programas de TV que prometem a cura, simulam milagres e promovem a extorsão de
bens aos mais desfavorecidos, de onde se depreende que as televisões se vendem
a estes canais. Há alguma autoridade ou observatório no Brasil que se preocupe
com este escândalo? Vejo pouca gente insurgir-se contra isto, como se fosse um
caso perdido…
– O esforço da Igreja no Brasil, particularmente da CNBB, é grande. Procura-se
formar a consciência dos cristãos, para que possam, por eles mesmos, escolher e
criticar o que fazem e ao que assistem. A consciência é uma espécie de guia da
ação, que ilumina o acto humano e o posiciona diante do bem e do mal.
– Ágape é o nome do seu último livro, com quase oito milhões de
cópias vendidas, e o nome significa amor incondicional ou amor sem limites –
conhece algum humano que o tenha conseguido, além de Deus feito homem? Como se
pode amar quem nos faz mal, por exemplo? Pode-se perdoar, o que já é amor, mas
amar?
– O “ágape” é o amor de Deus comunicado por Jesus a todos nós. Uma vida
toda e a própria eternidade estão diante de nós para crescermos sempre mais no
ágape, amor a Deus e aos nossos semelhantes. O ideal é indicado por Jesus no
Evangelho: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei. Amai vossos inimigos,
rezai pelos que vos perseguem.”
– No prefácio, Gabriel Chalita diz que o mal não pode vencer o bem, mas a
verdade é que vence e por vezes até em pessoas que, regra geral, não são
consideradas más. E a genética? E a orgânica? E o sistema nervoso? Não são
coisas que independem da fé e que por vezes a derrotam?
– Muitas palavras da Sagrada Escritura reforçam nossa convicção de que, no
plano da criação, o mal está subordinado ao bem. “Bem” é viver em
correspondência à verdade, presente em toda criatura, fiel aos planos de Deus a
seu respeito. Desviar-se de sua verdade, segundo Deus, leva-a ao acto mau que
se opõe à razão.
– Faz televisão e rádio diariamente e tem uma já grande carreira musical –
tem sofrido críticas de facções mais ortodoxas da Igreja.
– As críticas que porventura possam ter surgido sempre foram construtivas e,
no diálogo com o meu bispo, ajudaram-me a progredir no ideal, indicado pelo
Papa Bento XVI, de evangelizar através dos meios de comunicação.
– Como interpreta a falta de fé que se observa hoje em dia, e, noutro plano,
a falta de vocações religiosas?
– Diria que, em nossos dias, existe uma propensão para o relativismo e
hedonismo que distorcem a compreensão do verdadeiro sentido da vida humana.
Pois a vida só é verdadeiramente vida quando a realizamos no amor e na bondade
misericordiosa do Senhor. E viver bem significa agir e pensar bem, de acordo
com os princípios da razão iluminada pela fé.
– Portugal está a viver uma fase dramática, deixe-nos uma palavra…
– Portugal reside no coração dos brasileiros e tenho certeza de que o espírito
empreendedor e criativo o conduzirá à descoberta de novos horizontes,
propiciando ao povo português mais paz,
bem-estar e prosperidade. As bênçãos de Deus a todos os leitores.
Nota: por vontade da autora, este texto
não segue as regras do novo acordo ortográfico
Padre Marcelo Rossi: “A fé é a prova das coisas que não se vêem”
Referência para os brasileiros, o padre Marcelo Rossi é um fenómeno editorial: o seu mais recente livro já vendeu quase oito milhões de exemplares.
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