Poderia ter sido uma excelente dona de casa, garante Frances McDormand, mas quis o destino que se tornasse uma bem-sucedida atriz, cujo talento tem sido reconhecido pela crítica. “Trabalhei duramente. Foi-me dito, durante a minha formação enquanto atriz, que não tinha nascido com talento natural para a representação. Por isso decidi ir atrás dele, de forma sistemática, para provar que era capaz. Não sabia fazer outra coisa”, assegura Frances.
Adotada com apenas um ano de idade pela enfermeira Noreen e pelo pastor Vernon McDormand, a atriz passou a infância e juventude a saltitar de cidade em cidade, acompanhando o pai, que tinha como missão recuperar igrejas falidas, num caminho em que se foi deixando seduzir por algumas personagens de clássicos do teatro que ia interpretando. A estreia no cinema aconteceu aos 28 anos, com o filme Sangue por Sangue, realizado pelo marido, Joel Coen, e pelo cunhado, Ethan Coen, a dupla de cineastas com quem viria a colaborar em seis outros filmes, nomeadamente Fargo, que lhe valeu o seu primeiro Óscar e um SAG Award como Melhor Atriz.
Ao longo da sua carreira foram inúmeros os trabalhos que lhe valeram as maiores distinções, nomeadamente dois Óscares, dois Emmys e um Tony, três dos prémios mais ambicionados por quem se dedica à representação. Com eles chegou também um sem-número de pedidos de entrevistas, de propostas para se associar a campanhas de publicidade, de solicitação de presenças em festas e outros acontecimentos, todos eles sistemática e determinantemente recusados pela atriz. Isto porque a credibilidade de um ator, acredita, pode depender daquilo que este vai partilhando sobre a sua própria vida.
No caso de Frances McDormand, a informação sobre a sua vida pessoal é deliberadamente escassa, de modo a manter a neutralidade que lhe tem permitido ser generosa na autenticidade das suas personagens. “Fiz um esforço muito consciente para não dar entrevistas ou fazer publicidade durante 10 anos. Isto, na opinião de outras pessoas, poderia ser uma opção muito perigosa na carreira de uma atriz, mas valeu a pena exatamente pelos motivos que eu queria. Devolveu-me o mistério sobre quem eu era e, a partir de então, nos papéis que desempenhei, voltei a conseguir levar o público a sítios onde alguém que vende relógios ou perfumes e revistas não conseguiria”, defende a atriz.
Foi precisamente por ter mantido a sua imagem quase imaculada, a par do seu irrepreensível trabalho como atriz, que conseguiu vestir de forma tão genuína e autêntica a pele de Fern, a viúva que protagoniza Nomadland – Sobreviver na América. Realizado por Chloé Zhao, o filme já foi distinguido com o Leão de Ouro, o Globo de Ouro e o Critics Choise Awards, encontrando-se na lista dos favoritos aos Óscares, cuja cerimónia irá acontecer na madrugada de 26 de abril. Nesta história, a personagem de Frances vai-nos guiando por uma viagem pela vida de nómadas e, em comunhão com a Natureza, tenta-se despir da bagagem emocional que carrega, procurando não perder muito tempo com recordações. Enquanto as cenas se vão desenrolando, vamo-nos deixando levar pelas emoções da personagem, desenhadas num rosto com 63 anos de histórias.
“É difícil envelhecer na sociedade de hoje e creio que nós, mulheres, somos muito responsáveis por isso”, arrisca Frances, que nunca se deixou tentar pelas famosas intervenções estéticas que ajudam a atenuar rugas. “A determinada altura uma amiga chamou-me a atenção para o facto de as mulheres, sobretudo as mais jovens, precisarem de mim, da minha imagem, da minha voz. As minhas rugas são um mapa das estradas que percorri ao longo da minha vida. As pessoas que refazem as suas caras limpam essas estradas”, defende a atriz.