No passado dia 27 de maio, Ana Rocha de Sousa foi distinguida com o Prémio Activa Mulheres Inspiradoras na categoria Artes, no Teatro Tivoli BBVA, em Lisboa, pelo trabalho desenvolvido como realizadora no ano de 2020, com a direção do filme Listen, que lhe deu reconhecimento internacional no Festival de Veneza, onde ganhou quatro prémios. A atriz e realizadora, de 42 anos, agradeceu “do fundo do coração por me darem a possibilidade de ser Activa, mais uma vez, de ter a correta perceção e a maior gratidão mesmo pelas mais simples coisas”.
Ana usou o seu discurso de agradecimento para assumir, numa corajosa e poderosa mensagem, que foi vítima de abuso em 1995. “A vida escolheu entregar-me mais esta missão. Estou longe de ser a única a ter de guardar um nome, a verdade ou os detalhes escabrosos de uma violenta recordação. É importante sublinhar que acredito nas vítimas de assédio, mas não é disso que falo. Avancemos mais um passo. (…) Existe ainda o abuso sexual e a violação. Tudo isto é importante, mas falamos e temos de concordar que são coisas diferentes. Quero sublinhar que não existe uma mulher que não tenha tido medo de atravessar um parque escuro à noite ou um qualquer sítio mais óbvio de perigo iminente. Mas também quero sublinhar que não é possível manter o estado de alerta 24 horas por dia. Existe sempre um momento em que baixamos a guarda”, referiu, com a voz embargada, adiantando: “Um dia, também eu baixei a guarda, culpei-me. Era tão ingénua, próprio de tenra idade. (…) O perigo não está apenas nos lugares óbvios, protejam-se, seja perante a casualidade de um homem anónimo escondido nas dunas, seja por um cantor famoso que acham conhecer e parece tão seguro que nos encantou com palavras líricas e bonitas. Foi em 1995 a história que não vos posso contar. (…) A ti, abusador, assediador, violador, sejas tu um outro, um patrão, um homem da duna ou um cantor famoso. Fui ensinada a desejar o bem. O bem te desejo. Não pretendo destruir a vida de ninguém, jamais. Quero acreditar que passados mais de 25 anos és outra pessoa. Esperemos que sejas diferente e muito melhor. (…) Quero acreditar que deixaste de fazer uso da tua fama para assediar, aliciar teenagers para o teu universo sexual violento, louco e promíscuo. Quero acreditar que fui a única a ser forçada a crescer sozinha na vergonha da minha culpa.”
Após esta revelação, conversámos com Ana sobre os motivos que a levaram a fazer esta partilha.
Ana Rocha de Sousa: “Optar por verbalizar uma coisa destas é um risco enorme”
A realizadora e atriz, de 42 anos, revela, num discurso corajoso, que foi abusada em 1995.