Dizem que a cidade do Porto nasceu no morro da Pena Ventosa, onde as casas se encavalitam “umas nas outras e nelas sobrevivem a custo os velhos moradores, aqueles que construíram a Invicta e que o turismo e a modernidade vão empurrando para os subúrbios” onde “são as gentes que dão o colorido às vielas escuras aonde o sol quase não chega e onde subsiste a memória coletiva de um povo que se diz tripeiro”, começa assim a sinopse do novo romance de Rui Couceiro que escolheu este lugar como palco para as personagens deste livro, Morro da Pena Ventosa, apresentado no jardim do Solar dos Presuntos, em Lisboa, pelo escritor Miguel Esteves Cardoso, com moderação da jornalista Conceição Lino. Uma obra que aborda temas como a gentrificação, as alterações climáticas, a perda e o amor, que Miguel Esteves Cardoso, um dos ídolos do autor, descreve como “muito emocionante, muito violento, que tem uma componente trágica e que tem de ser lido rapidamente para sabermos o que vem logo a seguir. Deu-me uma vontade imensa de ser do Porto, ter nascido no Porto e uma inveja imensa de Lisboa não ter um romance como este”.
Lisonjeado com estas palavras, as quais agradeceu, o autor, natural do Porto, cidade onde vive, também não poupou elogios a Conceição Lino, que conheceu há dez anos na SIC onde entrou como estagiário quando achava que a sua vida seria o jornalismo, à editora, Sofia Fraga, e à namorada, Helena Sottomayor Cardia. “Tenho de agradecer à Helena porque ela incentivou-me a desistir de um doutoramento e de outros caminhos para escrever um romance, o Baiôa Sem Data Para Morrer. Ela entende as minhas necessidades, ela entende a necessidade me isolar, de ir para uma casa que tenho em Penedono e de me fechar lá a escrever e não estar com ninguém, de passar os fins de semana fechado a escrever quando podíamos estar a fazer outras coisas mais interessantes ou pelo menos mais divertidas e isso é de uma grande generosidade, de uma generosidade sem fim. Quem quer escrever precisa de alguém assim ou então fica sozinho e eu tenho a sorte de a ter encontrado e de ela me permitir isso”, disse.
E se o primeiro romance foi muito bem recebido pelo público e pela crítica, Rui Couceiro espera que as pessoas também gostem deste livro: “Não senti nada a chamada pressão do segundo romance. Limitei-me a escrever o livro que queria, usando o mesmo critério que tinha usado para o Baiôa sem Data Para Morrer: fazer um livro que eu próprio gostasse de ler. Mas é claro que espero que as pessoas gostem, que o livro encontre os seus leitores.” O escritor sublinha ainda: “Sou incapaz de seguir fórmulas no que quer que seja, mas sou disciplinado. Parece contraditório, mas não é, porque crio as minhas próprias técnicas, hábitos e rotinas a partir do que intuo e considero melhor ou mais adequado ao meu feitio e às minhas características. Por isso acho sempre que a literatura será mais bem-sucedida se cada um procurar menos o sucesso e, ao invés, fizer mais aquilo em que realmente acredita. Quero crer que uma literatura baseada nas inclinações, inquietações e obsessões de cada um – nos demónios pessoais, como lhes chama Vargas Llosa – será sempre mais verdadeira e por isso mais sedutora para quem lê”.
Fotos: João Lima