
Aos 69 anos, Teresa Guilherme continua a surpreender com a sua energia, humor e autenticidade, seja ao desafiar tabus sobre a sexualidade feminina no teatro ou a refletir sobre as opções que moldaram a sua vida, como a decisão de não ter filhos. Entre confidências sobre trabalho, saúde e a importância do descanso, Teresa inspira com a leveza e determinação de quem sempre viveu à sua maneira. Uma conversa imperdível sobre liberdade, preconceito e as pequenas e grandes felicidades do dia a dia, marcada a propósito do seu regresso aos palcos, desta vez com As Vaginas e Eu – Tudo o que Ficou por Dizer. Escrita pela apresentadora, em parceria com Miguel Dias, a peça estará em cena até 2 de fevereiro no Teatro Armando Cortez, na Casa do Artista, e partirá depois em digressão pelo país.
– Garante ser uma mulher frágil, mas não o aparenta. Onde é que anda essa mulher frágil quando se ligam as câmaras ou sobe ao palco?
Teresa Guilherme – No palco está uma mulher sensível, mas não a mulher frágil, porque ninguém conduz um programa ou toma conta de uma peça de teatro com fragilidades. A não ser que as fragilidades façam falta para as personagens, que não é o caso. Esta mulher que ali está em palco sou eu própria, não estou a representar. Estou a contar uma história que faz parte da minha experiência, coisas que aconteceram quando apresentámos a peça Monólogos da Vagina, perguntas que o público foi fazendo e que ficaram em aberto. E agora estamos a responder a essas e outras ideias, e tem sido muito divertido.
– Portanto, no fundo não é trabalho…
– Fisicamente é. É trabalho porque o levo a sério, porque quando o público nos vai ver temos de o respeitar, porque há que controlar o andamento da peça, o que as pessoas vão dizendo, para que todas se divirtam e manter, como se diz, “a bola a girar”, deixando crescer ali uma energia durante todo o espetáculo.
– Por falar em energia, lançou os búzios antes de estrear esta peça?
– Os búzios não se lançam assim. Podiam ter sido cartas, mas por acaso desta vez não o fiz.
– Costuma fazê-lo quando tem decisões importantes a tomar?
– Costumo aconselhar-me com o tarot, sim, ultimamente menos. Quando tenho necessidade de perguntar alguma coisa, pergunto, mas não é uma coisa tão constante como já foi na minha vida.
– Por algum motivo?
– Por nenhuma razão. Talvez porque esteja a fazer menos coisas.
– Tem estado mais ausente da televisão. Por opção própria ou falta de oportunidades?
– Não estou por falta de oportunidades, claramente. Continuo na televisão, como comentadora do magazine de famosos Noite das Estrelas, da CMTV. Mas o programa não é meu, é da Maya. Estou ali a fazer uma tarefa que não tinha feito nunca até aqui, que é ser comentadora.
– Falta-lhe um programa à sua medida? Que tipo de programa seria? Um reality show ou outro formato?
– Há pessoas que acham que comecei nos reality shows. Só fui convidada para fazer aquele reality show porque já era muito conhecida e tinha apresentado dezenas de programas. Porque, para apresentar bem aquele programa, é preciso ter experiência e vontade de querer trabalhar para ficar um trabalho perfeito. Se for analisar, divirto-me mais a fazer um concurso do que propriamente a fazer um reality show, que não deixa de ser um concurso. Também gosto de programas de conversas. Não sou fã incondicional de fazer entrevistas, mas pode surgir num formato qualquer que me pareça entusiasmante. A minha área foi sempre coisas com movimento, agitação.

– Qual é o segredo para se manter ativa, alegre e cheia de energia depois de tantos anos neste meio?
– É fruto de um processo que não começou hoje. Não é depois de velhos que as pessoas fazem alguma coisa para ficarem em forma. Sempre treinei, nunca fumei, não bebo café, não bebo refrigerantes, não como carne, nunca bebi uma Coca-Cola na vida, é interminável a lista… Tomo cuidado comigo, faço os meus detox, durmo as minhas oito horas, medito, e não conheço muitas pessoas que treinem todos os dias.
– Treina diariamente?
– Todos os dias, e vou ao fisioterapeuta de dez em dez dias e à massagem uma vez por semana. E isto desde os meus 30 anos. Sou muito cuidadosa em todos os aspetos da minha vida. Vou ao médico, faço os exames todos, check-ups, análises de três em três meses, depois da menopausa passei a fazer substituição hormonal com o médico Rodrigo Ayoub, portanto vou-me cuidando. As pessoas têm de se cuidar e agradecer todos os dias a Deus por terem nascido com a sorte de ter uma saúde equilibrada. Porque nós estamos sempre em equilíbrio e desequilíbrio. E se ajudarmos um bocadinho, o equilíbrio pende para bom. Há pessoas que têm no seu destino uma doença tremenda, como o cancro. Já é uma enorme sorte, uma grande proteção divina, não ter isso escrito na nossa vida, porque muitas amigas minhas já passaram por essa terrível experiência. Sobreviveram, graças a Deus, mas viveram-na, e isso não é por não se alimentarem bem ou não treinarem. Está escrito no nosso ADN que se tem propensão para uma doença ou outra. Tive a sorte de, até esta idade, ter muito pouca coisa de que me queixar nesse sentido.
– Parece ser muito disciplinada no tempo de descanso também.
– Sim, as férias, por exemplo, são imprescindíveis. São a parte mais importante da nossa vida, mais do que o trabalho. E só se chega a essa conclusão depois de velho. Sempre gostei muito de ir de férias e nunca estive muito tempo seguido a trabalhar sem fazer, pelo menos, pequenas pausas. Chamo-lhe a “fuga dos cágados para o deserto”. Tenho de ir três ou quatro dias para qualquer lado, nem que seja uma passeata ao Gerês. Ir para fora, admirar coisas bonitas, mudar os nossos horizontes visuais, ver um bom espetáculo.
– Tem 69 anos, já tem idade para pedir a reforma. Já o fez?
– Tenho a reforma desde o primeiro mês que fiz 66 anos.
– Orgulhosamente reformada?
– Apesar de ter continuado sempre a trabalhar, acho que as pessoas têm esse direito. Em Toronto, onde estive recentemente a fazer um espetáculo, adorei ficar a saber que as pessoas chamam à idade da reforma a idade da viagem. Porque ganham imenso dinheiro e vão viajar nessa altura. E não é aos 66 anos, é muito mais cedo. Nós não temos isso. Ficamos com menos dinheiro. Continuo a precisar de ganhar o meu dinheiro para equilibrar as minhas contas, mas é com muito prazer que recebo o SMS todos os meses a dizer que já tenho depositada na conta a minha reforma. Além disso, adoro ir para países civilizados em que os seniores têm descontos. No Canadá, por exemplo, paga-se metade nos bilhetes para espetáculos e nos transportes. No Brasil, os seniores passam à frente de toda a gente nas filas, adoro.

– Não ter tido filhos foi uma escolha consciente ou algo que a vida determinou?
– Foi uma escolha, sempre. Com tantos anos de vida e sendo tão fácil ficar grávida, a dificuldade é não engravidar. Portanto, sempre tomei as minhas precauções no sentido de não ficar grávida, porque nunca quis ter filhos. Uma decisão que tomei com 13 ou 14 anos. E nunca vacilei, nem por um segundo. Era uma determinação minha. E acho que as mulheres devem ser respeitadas também nessa sua escolha.
– Sente que a sociedade respeita essa opção?
– Nunca senti nenhuma pressão. Sei de pessoas que são muito pressionadas, e até se sentem diminuídas por não terem filhos. Às vezes querem e a vida não o proporciona ou não podem ter e sentem-se diminuídas, e isso é uma maldade do tamanho do mundo. Porque as pessoas têm direito à sua opção, não são menos mulheres ou menos pessoas por não terem filhos.
Maquilhagem: Raquel Jorge
Cabelos: Adriana Gouveia
Agradecemos a colaboração de Sheraton Cascais Resort