Este é um ano de viragem na vida de
Marianela Mirpuri. Sempre foi uma lutadora e, quando chega à conclusão de que um ciclo terminou, é a primeira a tomar a iniciativa de mudar de rumo, seja na vida profissional ou pessoal. Foi precisamente isso que se passou na sua relação com
Duarte Freitas, o engenheiro civil de 38 anos com quem namorava há cinco anos. "
Foi uma necessidade minha, que ele entendeu. Era uma decisão que estava na iminência de ser tomada, mas que só agora se concretizou", adianta a empresária, que abriu as portas de sua casa, no centro de Lisboa, para nos falar das suas paixões: o negócio de família ligado aos aviões a jacto, a música, e Pierre Louis, um bulldog francês que a filha,
Mónica, de 25 anos, lhe ofereceu há três anos.
– A que atribui o fim da sua relação com o Duarte? A chama da paixão esmoreceu?
Marianela Mirpuri – A paixão não dura cinco anos, nem comigo nem com ninguém, a chama extingue-se depressa, é muito efémera. Não teve nada que ver com isso. Acho que depois da paixão vem o amor, a amizade, o companheirismo, e acho que esses se foram diluindo ao longo do tempo.
– Terá sido o amor que desapareceu, uma vez que a amizade entre os dois se mantém?
– Claro que sim. Mais tarde até pode voltar o amor, mas para já estamos bem assim.
– Continua, então, a acreditar no amor?
– Claro. Já tive alguns amores, mas também desamores, passei por dois divórcios… Mas continuo a acreditar no amor, continuo a pensar que vale a pena apostar no amor, embora neste momento prefira estar sozinha.
– Parece que se tem refugiado na música, uma das suas grandes paixões…
– É verdade. Já gravei dois discos com um grupo de amigos, intitulados Cantigas de Amigos, e agora estou a concretizar o sonho de cantar com as minhas sobrinhas
Sílvia e
Luísa Mirpuri. Aliás, elas é que são as estrelas do disco, pois cantam muito melhor do que eu. O meu sonho sempre foi fazer alguma coisa mais profissional dentro da área do canto, mas enveredei muito cedo pela área empresarial e acabei por ir assumindo compromissos que me foram impedindo de me dedicar à música. Só agora, depois de ‘velha’, é que vou poder ver esse sonho ser concretizado através das sobrinhas.
– Apesar de ter aulas de canto lírico, acabou por gravar um disco de blues…
– Sim, decidimos fazer uma selecção de temas de blues, achamos que são mais intemporais e universais.
– Porque a Marianela é ecléctica no que toca a gostos musicais…
– Gosto de tudo, é verdade. Gosto de música, e quem gosta de música gosta de todos os géneros. Canto mais um tipo de música do que outros, até porque me dediquei mais a eles, mas sou capaz de cantar tudo. Sabendo trabalhar a voz e fazer a respiração correcta, cantamos qualquer coisa.
– E continua a encontrar na música a paz de espírito de que necessita?
– Claro, sempre. Aliás, tudo o que fazemos com paixão traz-nos paz de espírito, e a música é uma das minhas grandes paixões.
– Ainda tem uma máquina de karaoke em sua casa?
– Ainda, acho até que fui das primeiras pessoas a ter uma em Portugal. Canto sempre que posso, embora tenha pouca variedade de discos, porque em Portugal não há grande escolha.
– Li que chegou a ser directora de um coro…?
– Sim, quando estava a estudar na universidade, em Madrid, vivia numa residência universitária ocupada maioritariamente por estudantes da América Latina: brasileiros, argentinos, colombianos… Cantávamos muito aqueles clássicos argentinos, e eu adorava. Acabámos por formar um coro e saltitávamos aos fins-de-semana pelas várias residências universitárias a cantar.
– Nessa altura já era uma líder? Sempre teve esse espírito de liderança?
– Desde miúda que tenho espírito de líder, que se foi revelando desde muito cedo: primeiro, com os meus irmãos – era a segunda filha de sete irmãos -, mais tarde, na escola, onde era chefe de turma. Não creio que seja algo que se adquira, mas, mais do que esse espírito de líder, acho que tenho um espírito de iniciativa muito grande. Gosto de fazer coisas novas e de incentivar e desafiar os outros a fazê-las também. Se isso é ter espírito de líder, então se calhar tenho!
– O seu pai era indiano. Curiosamente, apesar de ser uma pessoa que viaja pelo mundo inteiro, passou muitos anos sem conhecer o país de origem da sua família. Há uma explicação para isto?
– Foi apenas uma questão de falta de oportunidade. O sonho e a vontade sempre existiram, mas as prioridades eram outras. Por exemplo, quando viajava sem ser em trabalho, tinha que escolher destinos de férias onde pudesse estar com os meus filhos, e a Índia não é propriamente um destino turístico familiar. De maneira que foi ficando para trás, mas claro que tenho intenção de lá voltar mais vezes. [Interrompe a entrevista para atender um telefonema] Era o meu tio, irmão mais novo do meu pai. Como vê, ainda mantenho contacto com as raízes indianas…
– O ano passado foi finalmente à Índia…
– Sim, em Maio. Fui com o Duarte. Percorremos o Rajastão num comboio que se chama Palace On Wheels. Aconselho, porque é uma viagem muito bonita. A Índia é mágica, tem aquele misticismo, e, para mim, diz-me mais ainda porque senti o chamamento do sangue. Costumo dizer que muita da minha calma – que não é tanta assim – vem do lado indiano. Acho que as pessoas na Índia têm um espírito muito diferente dos europeus, conseguem aguentar melhor as adversidades e gerir as situações mais difíceis com alguma meditação. Apesar de nunca ter feito ioga, é daquelas coisas que estão no sangue, e já me servi muitas vezes desse autocontrolo.
– E Luanda? Nasceu em Angola, mas também esteve muitos anos sem lá ir…
– Tenho BI e passaporte angolanos, mas não ia lá desde o 25 de Abril de 74.
– Como foi esse regresso ao país de origem 30 anos depois? Lembrava-se de alguma coisa?
– Sim, vi muita coisa que ainda era daquele tempo: o liceu onde estudei, a nossa casa, a praia do Mussulo… Fui revisitar os sítios que me diziam algo, que me faziam lembrar a minha infância.
– Emocionou-se?
– Muito. Aí senti o chamamento da terra. Assim que saí do avião e senti aquele cheiro da terra, característico de África… Veio até mim 30 anos depois como se o tivesse cheirado no dia anterior. Senti-me em casa e sinto-o cada vez que lá vou. É a minha terra. Por isso é que faço questão de ter BI e passaporte angolanos, e ando a estudar o que lá fazer em termos de negócio, na área dos jactos privados. Se fosse um sítio que não me dissesse nada, não teria essa preocupação.
– Os jactos privados são, aliás, outra das suas paixões.
– Sim, e são o meu trabalho, o meu sustento.
– E uma herança também?
– Também, sim. E aproveito para dizer que não gosto de ser rotulada de ‘milionária’. Considero-me uma pessoa privilegiada, mas tenho que ‘dar o litro’ para poder levar avante o meu trabalho, para me sustentar, porque não tenho ninguém que o faça por mim. Portanto, tenho que trabalhar muito para, pelo menos, não baixar o nível de vida.
– Uma filosofia herdada do seu pai?
– Exactamente. Somos uma família de pessoas de trabalho. E uma das heranças que recebi do meu pai é precisamente a convicção de que, antes do trabalho, está a dignidade, e só depois vem o dinheiro, que também conta, claro.