Marcámos encontro com
Margarida Pinto Correia na praia da Adraga, em Sinta, local escolhido pela própria jornalista por ser para si muto especial. Além de lhe trazer boas recordações da adolescência, é para ali que vai quando precisa de estar sozinha. Por isso, foi o cenário perfeito para a conhecermos melhor e falarmos sobre a sua vida, a sua relação de 14 anos com o músico
Luís Represas, os filhos,
Nuno, de 11 anos, e
José, de oito, e a Fundação do Gil, que dá um apoio alargado a crianças hospitalizadas, e da qual é administradora-executiva.
– Esta praia tem um significado especial para si?
Margarida Pinto Correia – Esta praia é mágica, tem uma energia incrível e é onde me sinto mesmo bem. Tenho uma relação com ela desde miúda, já vinha cá com os meus pais, e depois na minha adolescência com amigos, acampar, estar, namorar… Esta é uma praia que acolheu momentos de intimidade muito grandes comigo própria durante o meu crescimento. Tenho uma relação muito forte com o mar. Venho para aqui muitas vezes sozinha, quando preciso de respirar fundo e repor energias.
– Com que idade teve o primeiro namorado?
– Eu tive namorados muito tarde porque achava injusto para o resto dos meus amigos. Foi aos 15 anos, mas só durou três meses. A sério, foi aos 17 anos, quando fui estudar para os Estados Unidos, onde tive a minha primeira grande paixão, com um argentino. E foi aí que desbloqueei e comecei a pensar que se calhar era um bocado parvo não ter namorados por causa dos amigos [risos].
– Portanto, não foi namoradeira…
– Não. Tive pouco namorados. Gosto imenso do
flirt, mas não é com o objetivo de namorar, é pela sedução, pelo bom que é termos ainda a capacidade de nos seduzirmos e conquistarmos uns aos outros, sem ter nada a ver com sexualidade ou sensualidade. Só uma questão de energias e coisas boas. É muito bom conquistar e cativar pessoas. Gosto mais disso. Hoje em dia, não posso falar de ser ou não namoradeira, mas esse
flirt pode manter-se, no bom sentido. E eu aplico muito isso até na minha vida profissional no sentido de conquistar as pessoas para as minhas ideias e causas.
– Conquista/seduz as pessoas para ajudar a Fundação do Gil?
– É muito importante fazer isso com o Gil. É muito importante ter uma capacidade de sedução através de ideias e fazer com que as pessoas, por se sentirem bem, fiquem permeáveis àquilo que lhes quero dizer. E, por acreditarem na pessoa que está à frente delas, ajudarem e apoiarem. É uma excelente ferramenta e nem todas as pessoas a têm. E isso acho que consigo fazer com alguma naturalidade, não é uma coisa composta em mim. Eu gosto de pessoas, portanto, gosto de as conquistar e acredito profundamente naquilo que estou a fazer, que é recuperar a vida de crianças e das suas famílias.
– É preciso ter sangue-frio para lidar com a dura realidade pela qual passam as crianças da fundação…
– Sim, é. Mas eu acredito que nós desenvolvemos uma capacidade de ação perante a necessidade. Eu, no pânico, fico gelada. Ou seja, se acontece qualquer coisa de horrível aos meus filhos ao meu lado, é como se tudo ficasse em câmara lenta e fico profundamente racional. E nestas situações em que temos de funcionar para recuperar a vida destas crianças, acaba por funcionar muito esta atitude de me conseguir afastar e ver de longe. E temos de ter distanciamento suficiente para não julgar ou rotular as pessoas. E isso eu consigo com esse ‘desapaixonar’ que a exigência me dá.
– É uma pessoa muito racional…
– No dia-a-dia não sou nada assim. Sou super emotiva e apaixonada. Mas aprendi a controlar, acho que tem a ver com a idade e com a experiência.
– E quando é que se vai abaixo?
– Quando estou no carro sozinha, choro imenso e isso faz-me muito bem. Acho que as pessoas devem chorar. Quando venho conversar com o mar, também choro e deixo chorar. No duche, também… é sempre em momentos de intimidade comigo, primeiro tenho que resolver as coisas comigo…
– Em casa tem de manter uma imagem de força por causa dos seus filhos?
– Sim, não me posso ir abaixo à frente dos meus filhos. E tento não levar o trabalho para casa. Na única coisa em que levo o trabalho para casa é nas exigências com eles, e aí sou chata, não admito que façam birras por coisinhas. Digo-lhes:
"Vocês sabem lá o luxo de vida que têm, as maravilhas de condições que têm só por terem uma família, uma casa, e comerem todos os dias."
– E eles entendem isso?
– Entendem, mas eu sou conhecida, mesmo no meu grupo de amigos, por ser uma megera exigente. Tenho muitas regras, sou uma mãe muito exigente, sobretudo porque acho que há muito poucas regras hoje em dia, e as crianças precisam de baias para se desenvolverem. Eu sou veemente e muito pouco permissiva, por exemplo: nas horas para ver televisão, nos jogos, nos computadores, sou uma chata, mas acredito profundamente naquilo que faço e vejo à minha volta o resultado de quem não o faz, e não vejo diferença para melhor. Acredito que tudo o que os meus filhos fazem quando não estão a ‘aboborar’ em frente a um computador ou de uma televisão lhes dá imensas ferramentas para a vida em geral, para a construção da sua personalidade, e só isso é um ganho.
– E o que os leva a fazer?
– Acho que eles têm de experimentar as coisas mais loucas, mais abrangentes. No ano passado, por exemplo, meti-me no jipe com eles e levei-os até Marrocos. Cheguei a ir também com o Nuno uma semana para a Escócia, viver e trabalhar em comunidade. Todos os anos vou com eles, só nós os três, limpar praias para a zona de Sines e Melides. Vamos muito a museus, palestras, exposições… Fazemos caminhadas e descoberta do mundo a pé, rebolamos muito com os bichos. E eles sabem que há limites e se é hora de voltar, não há pedinchices. Se vão comigo ao supermercado e começam nas pedinchices, digo logo para compararem aquilo a um litro de leite. Têm de facto que perceber aquilo que estão a fazer e aquilo a que têm direito.
– O Luís também tem essa mesma filosofia com os filhos?
– O Luís pactua, percebe por onde é que estou a ir e não discorda. Mas tem uma maneira diferente de lidar com eles, é muito menos exigente, no sentido ‘megero’ que eu sou. Ele é muito mais ‘pai porreiro’, mais complacente com os desejos deles do que eu. Às vezes custa-me horrores ser assim, também me apetecia imenso fazer-lhes as vontades e dar-lhes só mimo, mas sei que mais à frente vai ser pior. Portanto, agora pago essa moeda.
– A Margarida e o Luís estão juntos há 14 anos…
– É muito tempo, muitos filhos [Luís tem dois filhos mais velhos de um anterior casamento], muito desgaste… Temos fases, como todos os casais, e nem tudo é um mar de rosas. A pior coisa que me podem dizer é que somos o casal perfeito. Não somos casal perfeito nenhum, somos iguais aos outros todos, estamos é mais expostos. E depois temos uma série de valores muito sólidos e comuns, portanto, o caminho que traçamos em família é muito inequívoco para nós e isso dá-nos muita solidez e cumplicidade. Depois, como todos os casais, há alturas em que estamos mais fartos um do outro e alturas em que estamos mais apaixonados.
– Ao fim de 14 anos… o que mais a irrita no Luís?
– [risos]. Não posso dizer. Seria injusto para ele.
– E o que mais gosta?
– São muitos anos, é difícil ter uma única coisa. Gosto muita da proporcionalidade inteligência/sentido de humor. O Luís tem um sentido de humor incrível. E quando se lembra que é divertido, é muito bom.
– E uma coisa que a Margarida tenha que tira o Luís do sério?
– Imensas [risos]. A minha disciplina, por exemplo, tira-o do sério, tal como o meu rigor. Ele diz que eu pareço uma agenda eletrónica e isso é um insulto e não um elogio. É que a gestão de uma família grande em vidas irregulares resulta se alguém segurar as pontas. Não gosto e digo muitas vezes aos meus filhos:
"Detesto ser polícia e adorava estar aqui no mimo com vocês, mas vocês é que me fazem estar aqui a ralhar, por isso, vejam lá se pactuam comigo um bocadinho!"
– Gostava de ter tido mais filhos? Pelo menos uma menina?
– Gostava. Acho que noutra encarnação fui ama-de-leite e adoraria continuar a ter filhos em permanência. Gosto muito desta relação íntima que se cria com os filhos. Confesso que ainda andei durante muito tempo a piscar o olho ao Luís, mas ele não quis.