Stéphanie não visitou os subúrbios de Joanesburgo com uma agenda protocolar. A princesa deslocou-se a este distante canto do mundo para ver com os seus próprios olhos a realidade que ali se vive. Para escutar e compreender. Durante pouco mais de dois dias, a filha mais nova de
Grace Kelly e
Rainier foi ao encontro dos habitantes e das ONG dos bairros mais desfavorecidos de Soweto e Alexandra, os distritos onde vivem os mais pobres de entre os pobres, e onde a esperança de vida é das mais baixas do mundo desde o aparecimento do VIH. Na África do Sul, mais de cinco milhões de pessoas – na sua maioria mulheres – são hoje portadoras do vírus da sida. No estado de Kwazulu Natal e arrabaldes, a pandemia estende-se mesmo a 40% da população. Como embaixadora itinerante da Onusida (programa conjunto das Nações Unidas na luta contra o VIH) e presidente da Fight Aids Monaco, a princesa Stéphanie levou até estas pessoas a mensagem de esperança de que fala nestas páginas. Uma entrevista em que fala também da sua família e dos seus filhos, que são a sua força.
– O que é que a leva a empenhar-se desta forma na luta contra a sida?
Stéphanie – Pôr a minha notoriedade ao serviço desta causa é essencial para as gerações futuras e também para o meu papel como mulher, mãe e cidadã do mundo. Num país como a África do Sul, é preciso entender que a população na faixa etária entre os 20 e os 45 anos está em vias de desaparecer. A doença deixa milhares de crianças órfãs que são rejeitadas e idosos que ficam sozinhos com dez ou quinze crianças a seu cargo. Tomar uma posição pública sobre isto ajudará certamente a que o mundo abra os olhos e nada me demoverá dessa missão.
– Romper tabus, despertar consciências, dá sentido à sua existência?
– Todos temos um papel a desempenhar neste mundo, cada um à sua maneira. No meu caso, o meu dever é estar disponível para os outros. Faço-o por amor, por convicção e porque o compromisso sempre foi um motor para os meus. Na minha família, sempre estivemos onde precisavam de nós.
– Com o passar dos anos, mostra-se cada vez mais envolvida, mais determinada…
– É um caminho vital que me trouxe até onde estou hoje. Esperei que os meus filhos fossem um pouco mais crescidos, porque o meu primeiro trabalho, para mim o mais grandioso de todos, é o de mãe. E depois ninguém se pode comprometer até estar preparado para o fazer. Há que aprender primeiro a lidar com o nosso sofrimento para depois podermos aliviar o dos outros.
– Nunca temeu perder-se na angústia das pessoas que a rodeiam?
– Estou aqui para ajudar, não para ser… uma esponja. Consigo que falem da sua vida, esforço-me para lhes devolver o seu lugar, a importância que sentem que perderam. Num dos subúrbios que visitei, passei algum tempo numa autêntica pocilga com uma jovem doente. Quando me fui embora, a sua expressão tinha mudado. Não tornei meu o sofrimento dela. Dei-lhe algo, e ela, em troca, deu-me mais luz.
– É optimista?
– Uma optimista incorrigível. Adoro a vida, e isso é o que me permite continuar.
– Adopta posturas que nem sempre agradam a toda a gente, vai até onde outros não vão…
– Ainda bem que pensam que sou corajosa. Vim ao Soweto, mas em França a minha mensagem seria a mesma. Ao lado das nossas casas há pessoas que sofrem em silêncio e que preferimos não ver. Que risco há em abrir o coração? O vírus da sida não se contagia com um sorriso. Não há angústias mais chiques ou mais apresentáveis que outras. Para acabar com a discriminação e erradicar esta praga, há que fazer tudo o que está ao nosso alcance.
FOTOGALERIA: O lado solidário de Stéphanie do Mónaco
– Foi a sua mãe, a princesa Grace, quem lhe abriu os olhos para o sofrimento alheio?
– A minha mãe mostrou-me o caminho que deveria seguir, o do amor, da serenidade, e do que ganhamos com isso. Desde criança que vi como ela agia. A minha mãe é um exemplo para mim, uma inspiração, um modelo. E também para os meus irmãos, que estão sempre envolvidos em acções humanitárias. Para nós, é uma consequência lógica da educação que os nossos pais nos deram. E espero que os meus filhos prossigam esta luta depois de mim.
– Pensa levar os seus filhos consigo em alguma missão no estrangeiro?
– Se eles quiserem e se sentirem preparados, por que não? Mas terá de partir deles, serão eles a decidir.
– Em sua casa fala-se abertamente sobre a sida?
– Tenho com os meus filhos uma relação muito próxima, falamos sobre tudo abertamente. No principado, em grande parte graças à Fight Aids Monaco, são levadas a cabo muitas campanhas de prevenção. Em breve serão os jovens a educarem os pais para este problema.
– Na luta contra a sida, como em muitos outros aspectos, a batalha contra a intolerância passa obrigatoriamente pelas mulheres?
– Estou convencida que sim. As mulheres são mais corajosas e mais decididas quando têm de enfrentar situações difíceis. Todas as ONG com que trabalho na África do Sul têm a liderá-las mulheres incríveis. E, acredite em mim, em alguns bairros não é fácil manter a moral e a confiança no futuro!
– Qual é a sua opinião sobre Nelson Mandela?
– É um homem que, apesar de tudo o que passou, nunca perdeu a esperança. Um homem que jamais deixou de acreditar na causa pela qual lutava, com amor, dignidade, doçura. Não há ódio no seu interior e, todavia, Deus sabe que poderia tê-lo!