Mãe de duas filhas, de sete e onze anos,
Ana Padrão já fez teatro, cinema e televisão; falta-lhe um musical para experimentar todos os registos. Em casa, devora filmes e lê, embora não tão compulsivamente como vê filmes, por falta de tempo. Considera que tem uma grande abertura em relação a tudo, mesmo a nível de vivências e experiências. Talvez por isso, não gosta de se fechar nem em grupos nem em meios. Reconhece que a grande curiosidade que tem em relação à vida e o interesse pelo ser humano a aproximam mais da sua profissão de actriz. Um interesse que a acompanha sempre, mesmo quando viaja ‘em cinco estrelas’ ou de mochila às costas.
– A idade preocupa-a?
Ana Padrão – Não. Penso nisso como todas as mulheres, mas não tenho problemas com a idade. Pelo contrário, acho que a melhor fase da mulher começa aos 40. Só a idade traz a maturidade. Já se passou por muita coisa, já se viveu muito.
– A paixão pelo teatro surge logo de pequenina, quando começou a representar?
– Acho que não, surgiu naturalmente mais tarde, mas é verdade que comecei a fazer teatro aos nove anos, na escola. Aliás, acho fundamental a disciplina de teatro e expressão dramática. Deveria ser obrigatória desde a primária, como a música, e deveria ter a importância das outras disciplinas.
– Ajuda a formar as crianças…
– Imenso. Trabalha a auto-estima e desenvolve imensas capacidades. Ajuda, por exemplo, crianças com problemas de socialização, que têm dificuldade em trabalhar em grupo e relacionar-se com os outros.
– Passou por essa experiência?
– Falo com conhecimento de causa, já que dei aulas durante algum tempo e gostei tanto que, possivelmente voltarei a dar. Os resultados que vi em certas crianças foram impressionantes…
– Não necessariamente para formar actores?
– Nada disso. É fundamental para qualquer pessoa como uma ajuda, uma arma para a vida. Como a música! As artes são fundamentais para o desenvolvimento do ser humano.
– Por isso faz questão de que as suas filhas tenham aulas de teatro?
– Felizmente, a mais nova já tem. Na escola onde elas andam não tinham, porque é uma escola semi-pública, mas este ano consegui que uma amiga fosse dar aulas para lá.

– Alguma das suas filhas manifesta vontade de ser actriz?
– Não, pelo contrário, já que é uma profissão complicada para quem tem crianças. É difícil conjugar as coisas. Por isso, é uma profissão que elas não vêem com bons olhos…
– Quando a vêem na televisão, o que lhe dizem?
– Não vêem, porque eu não deixo. As novelas passam muito tarde. E eu gosto que elas se deitem cedo. Claro que por elas, como todas as crianças, se eu não as obrigasse a ir para a cama, não iam.
– Ficou mais sensível às crianças depois da maternidade?
– Fiquei. Antes de ser mãe não tinha grande relação com crianças. Aliás, acho que a maternidade nos muda completamente; muda as prioridades da nossa vida e a forma como vemos o mundo. Muda tudo!
– Tem organizado workshops de teatro, alguns para crianças…
– A reciclagem é importantíssima na minha profissão, por isso, e sempre que posso, vou lá fora fazer workshops. Entretanto, como estava sempre a trabalhar e não tinha tempo para me deslocar ao estrangeiro, comecei a trazer professores a Portugal e a organizar workshops com uma amiga que também é actriz.
– Foi aí que surgiu o trabalho com as crianças?
– Fizemos workshops para crianças e, a certa altura, começámos a montar espectáculos. Entretanto, criámos uma associação. A nossa ideia foi proporcionar esta experiência a crianças que não têm possibilidade de a pagar.
– E o dinheiro?
– Não temos. Ensaiamos em garagens e parte do dinheiro da bilheteira reverte para bolsas que atribuímos a instituições e associações. O último benemérito que tivemos foi o Casino Estoril, que nos cedeu a sala três dias, e conseguimos montar a peça só com amadores e um professor espanhol. Com o dinheiro da bilheteira deste espectáculo comprámos camas articuladas para um lar e pintámos as instalações do lar.
– Como se contacta a associação?
– Através do site, www.umsotecto.pt. É um projecto que queremos continuar a fazer: usar a nossa criatividade para ajudar.
– É muito descontraída na forma como se arranja: não usa saltos, anda de jeans…
– Gosto de me sentir o mais confortável possível. Aliás, para mim é extremamente complicado comprar roupa.
– Também tem cuidados de beleza e sei que trata a sua pele com muito cuidado…
– Tenho de cuidar, porque tenho uma pele muito difícil. Andei muitos anos em dermatologistas porque desde que comecei a trabalhar, começaram os meus problemas de pele, eventualmente devido às maquilhagens e à luz, mas também às mudanças de clima e hormonais. E stresse. Muito stresse.
– O stresse também se reflecte na pele?
– No meu caso, sim. Começo a emagrecer e com problemas de pele. Por isso fiz recentemente um tratamento de laser na clínica Corpuslaser, do Dr. Lima Duque, e tive muito bons resultados.
– Nunca usa maquilhagem…
– No dia-a-dia nunca me maquilho. Já basta a maquilhagem que tenho de usar quando faço televisão ou cinema. Quando não estou a trabalhar, deixo a pele repousar o mais possível. E ainda tem outra vantagem: as pessoas quando me vêem de cara lavada na rua dizem-me que pareço muito mais nova.
– Tem cuidados com o corpo? Pratica desporto, vai ao ginásio?
– Estou sempre a ir e a desistir. Por um lado, tenho muito pouco tempo por causa dos horários complicados, por outro, sou muito preguiçosa. É muito difícil gerir isto, sobretudo porque é uma profissão muito exigente a nível emocional. É suposto estar sempre bem!

– O que nem sempre é fácil…
– Tudo o que não se consegue num sítio onde não há uma indústria. As pessoas não têm noção do que é o trabalho de actor. Vêem as revistas e os eventos sociais e acham que temos uma vida luxuosa, que nos passeamos naqueles vestidos lindos, que temos uma vida extraordinária.
– É um mito?
– Completamente. Claro que há actores que têm uma vida confortável, mas são seis ou sete… e tiveram um processo de trabalho alucinante para chegar lá. Para o que fazemos, somos muito mal pagos. É muito difícil ter qualidade de vida neste país e não me refiro só ao nível económico.
– A crise também afecta os artistas…
– E de que maneira. Como há menos dinheiro, trabalhamos cada vez mais e ganhamos cada vez menos. O problema não é só a instabilidade económica, é o esgotamento a que se chega!
– Não há protecção?
– Nada. Não temos leis que nos protejam, o sistema não está feito para nos proteger. Se estamos a trabalhar, ganhamos, se não estamos a trabalhar, não ganhamos. Todos os trabalhadores têm direito a fundo de desemprego menos nós. A mim choca-me que os anos continuem a passar e nada mude.
– Mas imagino que não trocaria a sua vida de actriz pela de dona de casa e mãe…
– O papel de mãe é o mais difícil, mas também o melhor da minha vida! De facto, a responsabilidade de organizar uma casa, de ter todos felizes e contentes, de nos preocuparmos com as pequenas coisas e ainda termos tempo para pensarmos em nós e nas nossas carreiras é um esforço enorme.
– Foram as mulheres que se bateram toda a vida por isso…
– E ainda bem, conquistámos o nosso lugar no mundo e estamos ao lado dos homens, com todo o direito, mas não há dúvida de que complicámos a nossa vida! Continuamos a fazer exactamente a mesma coisa, com a agravante de termos de ser excelentes profissionais e de provarmos que somos tão boas ou melhores do que os homens, porque entrámos no mundo deles, e isso é altamente desgastante.
– A solidão e o desmembramento das famílias também têm que ver com isso?
– Estou convencida que sim. Poucos homens têm capacidade para aguentar uma mulher poderosa em casa. Num casal, quando há duas pessoas com grande capacidade de decisão e independência económica, as coisas começam a complicar-se. Por um lado, conquistámos o mundo, por outro, teremos de viver num mundo diferente.
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